Em história militar, temos vários casos de obsessão
por escrever seu nome na história superando os feitos de algum antecessor e, em
muitos casos, seu próprio pai. Alguns têm sucesso nessa tarefa, como Alexandre,
o Grande, que fez com que as proezas de seu pai fossem de certa forma
diminuídas diante de sua própria grandeza. Porém, nem todos conseguem ter
sucesso nessa tarefa e fracassam de maneira retumbante. Esse é o caso de Takeda
Katsuyori, que queria entrar para a história tendo o mesmo sucesso que seu pai,
Takeda Shingen, mas acabaria alçando outra figura à condição de lenda, Oda
Nobunaga.
Politicamente, o Japão era governado por líderes
militares chamados de shoguns, com a figura do imperador sendo meramente
decorativa desde 1185. O cargo de shogun seria ocupado pela família Ashikaga
por séculos até que em 1467 eclodiria a chamada Guerra de Onin, que resultaria
na perda de poder do shogunato Ashikaga que fez com que os senhores feudais, os
daimyôs, percebessem que poderiam usar da força para conquistar mais terras de
daimyôs mais fracos sem que houvesse quem os impedissem. Sobre a Guerra de
Onin, recomendo assistir o vídeo do canal do Felipe Aron que explica mais sobre
isso.
Esses conflitos prosseguiriam por quase um século
até que todo o Japão fosse dominado por alguns daimyôs, que se alternavam entre
formar alianças e lutar entre si. O shogun também se tornaria uma figura
praticamente decorativa, com pouco poder político ou militar, mas ainda cheio
de poder simbólico. Pela convenção antiga, o shogun deveria ter linhagem com a
família Minamoto, privilégio exclusivo dos Ashikaga. Então, para dominar o
Japão, seria necessário dominar o cargo de shogun, mesmo sem assumi-lo.
Em 1560, um poderoso daimyô, Imagawa Yoshimoto,
planejava marchar até Quioto, capital do Japão na época, para tornar o shogun a
sua própria marionete. Porém, no caminho estava Oda Nobunaga, um daimyô menor,
mas sem a disposição de simplesmente abrir caminho para Imagawa. Cheio de
confiança, Imagawa marcharia até Owari, onde seria derrotado na Batalha de
Okehazama por Oda Nobunaga apesar de ter uma vantagem numérica de 12 para 1.
Essa vitória colocaria Nobunaga entre os grandes daimyôs e, juntando habilidade
militar e localização estratégica, o tornou alvo preferido para alianças. Entre
elas, surgiria um pacto com o daimyô da província de Mikawa, Tokugawa Ieyasu,
que era um seguidor de Imagawa e que acabou se libertando dessa obrigação com o
resultado da Batalha de Okehazama.
Pelos próximos quinze anos, Nobunaga trabalharia
com batalhas, alianças, casamentos, intrigas políticas e construção de castelos
para ampliar o seu poder até que em 1568 entraria em Osaka com o seu Ashikaga
de estimação, Ashikaga Yoshiaki, que ele proclamou shogun. Apesar de agora
deter o shogunato, Nobunaga dominaria apenas uma parte do Japão e possuía
inimigos poderosos como os Mori ao oeste, Uesugi ao norte e os Takeda ao leste.
A maior ameaça e o oponente em Nagashino viria do
clã Takeda. Os Takeda liderados por Takeda Shingen entre 1521 e 1573 poderiam
tentar o mesmo que Imagawa e que foi conseguido por Oda Nobunaga, mas três
coisas impediam: o isolamento em seu território nas montanhas, que fazia com
que precisasse passar por estradas vigiadas pelos aliados de Oda, que eram os Tokugawa,
e por fim os vários conflitos paralelos, principalmente contra os Uesugi no que
ficaram conhecidas como Batalhas de Kawanakajima.
Em 1572, Takeda Shingen começaria uma ofensiva contra
Quioto, tendo que passar pelos Tokugawa. Derrotaria o inimigo no castelo de
Hamamatsu e enfrentaria Tokugawa Ieyasu nas planícies de Mikata-ga-hara, onde o
inverno selaria o empate para esse ano. Mesmo assim, o resultado encorajaria
Shingen a insistir nas ofensivas e sitiaria o castelo de Noda. Tudo levava a
crer que o clã Tokugawa seria derrotado, quando a curiosidade faria uma das
suas principais vítimas na história. O castelo de Noda possuía um grande
estoque de sake, o vinho de arroz japonês, e os sitiados resolveram dar a mais
digna finalidade a esse sake: beber e fazer uma festa. Melhor isso do que
deixar que o inimigo fizesse o mesmo após tomar o castelo. O som da música dos
shakuhachi chegaria nos sitiantes e Shingen se aproximaria para ouvir a música
mais claramente. Seria então visto por um atirador e alvejado, vindo a morrer
alguns dias depois.
Noda não cairia e Shingen seria sucedido por Takeda
Katsuyori, que manteria a obstinação para invadir o território de Ieyasu e
depois marchar para Quioto. Em 1575, seguiria para uma nova campanha indo uma
rota diferente, prosseguindo diretamente para a capital do território dos
Tokugawa, o castelo de Okazaki na província de Mikawa. Fez isso porque tinha a
informação de que um traidor abriria os portões do castelo. Porém, o traidor
seria encontrado e morto, deixando Katsuyori sem o seu principal trunfo e sem
força suficiente para tomar Okazaki. Resolveria voltar, mas por outra rota
seguindo o rio Toyokawa, protegida por três castelos. Tentaria tomar o castelo
de Yoshida, porém não teria sucesso e voltaria para a região das montanhas. Seu
caminho o levaria até um castelo chamado de Nagashino.
Comandantes
Opostos
Takeda Katsuyori recebeu a ingrata tarefa de
suceder uma lenda, seu pai, Takeda Shingen. Durante a expansão territorial
empreendida por Shingen, os Takeda tomariam territórios nas províncias de Kai e
Shinano e derrotaria o daimyô chamado Suwa Yorishige, que seria forçado a
cometer suicídio após um acordo de paz humilhante. Ele tinha uma bela filha de
14 anos cuja mãe era a própria irmã de Shingen. Tomado por um fascínio que fez
com que desconfiassem que a garota fosse uma raposa disfarçada de mulher,
Shingen a tomaria como uma de suas esposas e dessa união nasceria Katsuyori.
Katsuyori se tornaria o filho favorito de Shingen,
tanto que seria o seu sucessor. Era um hábil comandante treinado na tradição
Takeda, uma escola que privilegiava o combate móvel e o uso de cavalaria.
Mostraria o seu valor nas Batalhas de Kawanakajima e em Mikata-ga-hara, mas
teria uma série de inimigos dentro do clã Takeda. Tinha aliados entre os idosos
generais, mas muitos dos antigos servos de seu pai o viam com desconfiança.
Para piorar, desconsideraria o conselho dos generais e avançaria contra Mikawa.
Do outro lado, temos Oda Nobunaga. Já na época da
Batalha de Nagashino era considerado um dos grandes líderes samurais e havia um
respeito mútuo entre ele e seus generais. Tinha grande arrojo, mas também sabia
escutar conselhos, ao contrário de Katsuyori, uma lição aprendida quando um de
seus comandantes cometeu suicídio quando teve seu conselho ignorado. Teria seu
grande momento até então na Batalha de Okehazama, onde uma inteligente leitura
da situação e uma rápida resposta às circunstâncias foram essenciais. Veria que
o exército de Imagawa estava comemorando a queda de um de seus castelos e
armaria um ataque surpresa, mostrando o seu cuidadoso planejamento aliado com
rápida execução. Em adição a isso, veria que não poderia derrotar todos os seus
inimigos sozinho e também buscaria alianças, o que foi fundamental para a
vitória na Batalha de Anegawa.
Para complementar, Oda Nobunaga sabia ser cruel,
massacrando dezenas de milhares de monges budistas do exército de camponeses
Ikkô-ikki que se opuseram a ele. Ele deveria ter mais gratidão com esses
monges, que o ensinaram a ser flexível durante a batalha e com quem aprendeu a
usar armas de fogo, mas gratidão não passou por sua cabeça quando incendiou o
templo no Monte Hiei. Por fim, estando basicamente no centro do Japão, estava
sempre na vanguarda da tecnologia militar, contando com um bom relacionamento
com os mercadores portugueses e tolerância com o cristianismo.
Tokugawa Ieyasu mostraria ao longo de sua carreira
um comando arrojado nas linhas de frente aliado com paciência e diplomacia nos bastidores,
que fariam com que tivesse sucesso nessa época e também décadas adiante. Graças
a essas qualidades conseguiria o apoio de Nobunaga, que não estava em contato
direto com o avanço de Katsuyori. Por fim, temos Okudaira Sadamasa, responsável
pela defesa de Nagashino. Sadamasa era um aliado de Takeda Shingen e sua
família era mantida refém pelos Takeda. Com a morte de Shingen, Sadamasa
decidiu se juntar novamente aos Tokugawa e removeria tropas que protegiam o
castelo de Tsukude para os Takeda, ao custo da vida de sua esposa e irmão mais
novo. Sabendo que Sadamasa seria um inimigo amargo para os Takeda, Ieyasu o
nomearia como guardião de Nagashino e poderia contar com um aliado obstinado
para proteger essa posição.
Exércitos
Opostos
Na Batalha de Nagashino, Takeda Katsuyori dispunha
de 15 mil homens e enfrentaria inimigos em muito maior número, 30 mil sob o
comando de Oda Nobunaga, 8 mil sob Tokugawa Ieyasu e mais 500 que estavam em
Nagashino liderados por Okudaira Sadamasa.
Nobunaga empregaria 30% de seu exército na Batalha
de Nagashino e teria a sua disposição 3.500 mosquetes, que se mostrariam úteis
contra a forte cavalaria dos Takeda. Ieyasu utilizaria 64% do seu exército em
Nagashino, mas podemos dizer que todas as suas forças estavam mobilizadas para
enfrentar Katsuyori, já que o restante estava defendendo castelos contra a
ameaça dos Takeda.
Não há muitos detalhes sobre a composição das
forças de Nobunaga e Ieyasu, mas os cronistas de Katsuyori registraram em
detalhes como era o seu exército em Nagashino. Não cabe aqui entrar em
detalhes, mas a estimativa é que a principal força do exército eram os 4 mil samurais
a cavalo, que eram acompanhados por dois soldados rasos cada, e mais três mil
ashigarus, infantaria leve, por assim dizer. 47% do exército de Katsuyori
estava mobilizado em Nagashino, o restante enfrentando Ieyasu e os Uesugi.
Katsuyori contava apenas com 655 arcabuzes, o que seria uma desvantagem contra
os 3.500 do inimigo.
Planos
Opostos
Oda Nobunaga seria decisivo para os rumos da
batalha, mas não se dedicaria muito a ela nos estágios iniciais e só teve maior
interesse quando viu que isso envolvia salvar o seu aliado, Ieyasu. Viu também
uma oportunidade de desferir um golpe fatal contra Katsuyori enfrentando apenas
metade de seu exército.
A campanha começou em 30 de maio de 1575, quando
Katsuyori sairia de seu território para tomar o castelo de Okazaki contando com
o auxílio de um traidor. Tratava-se de Oga Yashiro, uma espécie de secretário
de finanças de Ieyasu que decidiu se voltar contra o seu mestre. Seria
descoberto e em seguida executado, não sem antes passar sete dias agonizando. Katsuyori
desistiria de seu plano inicial e se dirigiria para atacar o castelo de
Tsukude, o mesmo abandonado por Okudaira Sadamasa. Desistiria de tomar esse
castelo também, julgando que o cerco seria arriscado, pois demoraria e o
exporia a ataques pelas costas. Após abrir mão de dois alvos, não desejava sair
de Mikawa sem obter nenhum ganho e iria atrás do último castelo do rio
Toyokawa, Nagashino, defendida por Sadamasa. Além de atacar um desafeto,
tomaria uma posição estratégica e coroaria a campanha de Mikawa.
Mas o começo da Batalha de Nagashino não se daria
no próprio castelo, e sim no castelo de Yoshida, protegido por Sakai Tadatsugu
e que contava como hóspede o próprio Tokugawa Ieyasu, repetição de uma situação
que havia surgido na em Mikata-ga-hara que teria como vencedor, ao menos moral,
Takeda Shingen. Mas Katsuyori não ficaria muito tempo sitiando Yoshida e se
dirigiria para o que se tornou o alvo principal, Nagashino, que era uma posição
naturalmente defensiva forte cercado pelos rios Takigawa e Onogawa que se
juntam e formam o Toyokawa.
O plano de Katsuyori era tomar as elevações
próximas de Nagashino e de lá lançar ataques contra o castelo. Passaria o
primeiro dia da ofensiva posicionando as suas tropas e depois começaria quatro
dias de ataques contra Nagashino. A guarnição que protegia o castelo estava em
desvantagem de 1 para 30, mas lutou bravamente com arcos, lanças e mosquetes.
Katsuyori tentou invadir o castelo por uma escarpa atravessando o rio. Parece
que hoje em dia seria impossível atravessar o rio de jangada a essa época do
ano, mas nem foi esse o problema do exército de Takeda, e sim a resistência dos
defensores.
No quarto dia, Katsuyori utilizaria um ataque
noturno que faria com que os defensores recuassem para as defesas mais
interiores. Na mesma noite, começaria a trabalhar em uma torre de cerco, que
seria construída com sucesso, mas logo derrubada pelo canhão que estava em
Nagashino. Começaria então uma segunda fase de ataques, novamente com ataques
noturnos em duas frentes. Katsuyori tentaria uma nova estratégia, cavar túneis,
o que resultaria no desmoronamento de uma das paredes. Isso não teve nenhum
impacto efetivo, mas o barulho afetaria psicologicamente os defensores, que
estão lutando por vários dias seguidos sem descanso, enquanto que os sitiantes,
em maior número, podiam se dar ao luxo de fazer um rodízio das tropas.
Katsuyori avançaria ainda mais sobre as defesas do castelo, mas tendo falhado
em atravessar o rio, cavar túneis e usar uma torre de cerco, passou a imaginar
que a sua única possibilidade era um ataque frontal. Decidiria, no entanto, matar
de fome os defensores, imaginando que eles teriam suprimentos para apenas mais
alguns dias. Cercaria o castelo e bloquearia todas as saídas, inclusive pelos
rios.
Os defensores continuariam revidando como podiam,
usando os seus mosquetes para acertar quem ficava no alcance, causando algumas
baixas durante os dias de relativa calmaria. Apesar de ainda estar em muito
maior número, as forças de Katsuyori sofreram pesadas baixas. Mas, tirando
isso, estava no controle da situação e só precisaria de tempo para forçar
Nagashino a se render.
E então que temos uma história digna de anime ou de
mangá. Os defensores precisavam alertar Ieyasu e Nobunaga da situação de
Nagashino. Haviam enviado um emissário antes do bloqueio, mas não obtiveram
resposta e sequer sabiam se ele tinha chego a Okazaki. Então, Torii Sune’emon
se voluntariaria para a missão suicida de passar pelo bloqueio e ir até Okazaki
alertar os aliados. Sairia do castelo e iria para o rio, que estava bloqueado
por uma rede, que ele conseguiria cortar e atravessar o rio sem chamar a
atenção. Faria um sinal luminoso para avisar que tinha conseguido fugir e se
dirigiria para Okazaki, onde estavam ambos Ieyasu e Nobunaga, que ouviriam a
sua história e a situação de Nagashino, prometendo enviar reforços.
Não contente com isso, Sune’emon faria o caminho de
volta para Nagashino. Sinalizaria novamente para dizer as boas notícias, mas,
ao invés de esperar o reforço, tentaria entrar no castelo. Passaria pelo rio,
porém, dessa vez havia uma série de cordas com sinos no rio, que
inevitavelmente alertaria para a sua presença e resultaria em sua captura.
Katsuyori ouviria a sua história e até se admiraria com tamanha coragem.
Ofereceria uma troca de lado que Sune’emon aceitaria. Suspeitando de sua
sinceridade, Katsuyori enviaria seu suposto aliado de volta para Nagashino com
a ordem de dizer que não havia esperança e que os defensores deveriam se
render. Ao invés disso, gritaria avisando que ajuda estava a caminho e seria
morto por isso. Mesmo assim, seria admirado pelos dois lados da batalha como um
grande exemplo de bravura.
A Batalha
Katsuyori então teria que decidir sobre o que
fazer, ficar e lutar ou fugir do exército de Nobunaga e Ieyasu. Recuar talvez
fosse a opção mais sensata, mas Katsuyori sentia que a sua honra estava em
risco e que ele não poderia mais uma vez fugir da batalha. Ele queria imitar os
feitos de seu pai em Mikata-ga-hara e insistiria em lutar. Porém, Nagashino era
Mikata-ga-hara às avessas, com Katsuyori em desvantagem numérica e inclinado a
cair na armadilha indo para o confronto. Ieyasu, derrotado no passado, aprendeu
a lição e não foi para a luta em Yoshida, mas Katsuyori estava disposto a se
arriscar
Se esse era o plano, um de seus generais, Baba
Nobuharu, sugeriu que a luta contra Nobunaga se desse de dentro do castelo.
Essa sugestão seria rejeitada e Katsuyori preferira uma batalha em campo
aberto. Talvez ele não soubesse, mas seus generais sabiam que esse era um plano
suicida, mas seguiriam seu líder por lealdade a Takeda Shingen.
Como prometido a Torii Sune’emon, Nobunaga e Ieyasu
sairiam de Okazaki para auxiliar Nagashino com 38 mil homens. Marchariam até
Nagashino e em dois dias chegaram à planície de Shidahara, a seis quilômetros
de distância do castelo, e esse seria o local escolhido por Katsuyori para
lutar.
As forças de Nobunaga e Ieyasu se posicionariam de
forma a ter o rio Toyokawa no flanco direito e montanhas no flanco esquerdo. A
lógica por trás de todos os preparativos era o medo da cavalaria dos Takeda,
ambos comandantes já tendo sofrido derrotas para ela, apesar de estarem sob o
comando de Takeda Shingen anteriormente. Se posicionariam de forma a ter o
pequeno rio Rengogawa entre as duas linhas, nenhum obstáculo formidável, mas
suficiente para atrasar a cavalaria. Para auxiliar os seus mosquetes,
construiriam paliçadas para oferecer alguma proteção. O flanco esquerdo era
protegido contra um cercamento por meio das florestas e Nobunaga aceitou
arriscar o flanco direito ao espalhar mais as suas unidades.
O arranjo de armas, lanceiros e paliçadas permitiu
que Nobunaga tivesse controle sobre o impacto do ataque de Katsuyori em suas
fileiras. Nobunaga conhecia as forças de seu inimigo e se prepararia de forma
adequada. Sabia que tempo era essencial para essa batalha e usaria o rio
Rengogawa como proteção natural para reduzir a velocidade da cavalaria inimiga.
As paliçadas seriam mais um acréscimo para garantir segundos preciosos para que
as armas de fogo fossem recarregadas. Outro fator importante seria a rígida
disciplina, os seus melhores samurais comandando os ashigarus seguindo
estritamente as suas ordens, o que não era exatamente o padrão das batalhas
japonesas.
Katsuyori dividiria o seu exército para enfrentar
os novos inimigos ao mesmo tempo em que mantinha o cerco a Nagashino. 12 mil
iriam ao ataque divididos em quatro divisões e 3 mil seriam deixados para
trás. As divisões de ataque seriam
dispostas no campo de batalha com três unidades à frente e uma quarta na
retaguarda no apoio, formação que seria poeticamente conhecida asa da garça
azul, kakuyoku.
Ao mesmo tempo em Katsuyori estava planejava para a
batalha, Nobunaga fazia o mesmo de seu lado. E, em um momento digno novelas de
samurai, Sakai Tadatsugu sugeriria um ataque noturno surpresa e seria duramente
repreendido por Nobunaga, não apenas pela ideia, mas também por falar fora de
sua vez. [A gente até consegue imaginar] Acontece que a ideia não era estúpida
e Nobunaga teria uma reunião particular com Tadatsugu, contando que a sua
reação era uma forma de despistar espiões e que o seu plano seria executado e
ele lideraria a ofensiva. À meia-noite, Tadatsugu deixaria o quartel-general
junto com 3 mil homens e atravessaria 8 quilômetros coberto pela noite e pela
chuva, se posicionando a espera do amanhecer.
Na manhã seguinte, Katsuyori iria ao ataque. Sabia
que o inimigo possuía um grande número de mosquetes, mas esperava que a chuva
do dia anterior e o elevado número de cavalaria morro abaixo pudessem
equilibrar a situação. O plano era aguentar a primeira salva de tiros,
insuficiente para aniquilar a sua cavalaria, e depois atacar os indefesos
ashigarus enquanto recarregavam as suas armas. Com o apoio da infantaria, havia
uma boa chance de levar a melhor contra os inimigos, passar pelas paliçadas e
botá-los para correr, até o ponto em que o Toyokawa cortasse a rota de fuga.
A hora da batalha chegou. A cavalaria avançaria
contra as forças de Nobunaga, tendo o momento atrasado pelo rio Rengogawa.
Nobunaga poderia ordenar que os primeiros tiros fossem disparados a uma
distância maior ou que as forças avançassem contra o inimigo, mas deixaria que
chegassem a 50 metros para iniciar a resposta. A primeira salva de tiros não
assustaria Katsuyori, era parte do plano, mas o que ele não esperava era a velocidade
com que viria a segunda salva, e depois a terceira. Os cavaleiros que
sobreviveram ao ataque dos mosquetes teriam ainda que enfrentar os lanceiros,
samurais, paliçadas e a confusão sobre a situação que claramente saia ao
controle. A batalha não seria tão rápida quanto alguns relatos dizem e não
seria decidida apenas pelas armas de fogo, mas esse foi definitivamente um
fator decisivo para o exército Oda-Tokugawa.
Para piorar a situação para Katsuyori, vamos
lembrar de Tadatsugu, que ao mesmo tempo em que o inimigo avançava armava um
ataque na retaguarda. O exército dos Takeda estava totalmente alheio a
Tadatsugu e garantiu uma vitória até que fácil. Os sitiantes de Nagashino viram
a fumaça produzida pelos 500 mosquetes de Tadatsugu, mas não podiam fazer nada,
pois não estavam em número suficiente e estavam posicionados muito longe para
poderem ajudar. Aproveitando a situação, os sitiados de Nagashino foram para o
ataque contra os sitiadores.
Em Shidarahara, a batalha prosseguia por horas a
fio. A vantagem era toda do exército Oda-Tokugawa, mas os homens de Katsuyori
continuariam a lutar. Teriam mais sucesso contra o flanco direito do exército
inimigo, não protegido por paliçadas, mas teriam sérias dificuldades do mesmo
modo que as outras divisões. Katsuyori utilizaria as suas últimas forças para
uma última ofensiva, mas nem tropas frescas e de alta qualidade teriam grande
impacto nos rumos da batalha.
Após oito horas de combate, Oda Nobunaga ordenaria
o recuo de suas forças de volta para as paliçadas. Katsuyori aproveitaria essa
ocasião para fugir de volta para o seu território e seria perseguido pelo
exército Oda-Tokugawa O saldo final seria 10 mil baixas para o exército de
Katsuyori, ou 67% do total, contra 6 mil mortos do lado Oda-Tokugawa, ou 16% do
total.
Após a derrota em Nagashino, Katsuyori retornaria
para o seu território e por lá ficaria e passaria os próximos sete anos em
posição defensiva lutando desesperadoramente para sobreviver. Teria ainda como
inimigo Ieyasu, mas por sorte Uesugi Kenshin morreria em 1578 e os Uesugi
ficariam ocupados demais discutindo a sucessão para incomodá-lo. Kai e Shinano
eram fáceis de proteger, de forma que conseguiria sobreviver ao assédio de
Ieyasu. Mesmo assim, perderia territórios e sofreria com o abandono de seus
aliados até que, entre derrotados e traidores, basicamente só sobrasse os seus
familiares.
Com o seu exército definhando e abandonado por
todos, em 1582 decidiria pôr fim a tudo, auxiliando no suicídio de sua esposa e
depois cometendo hara-kiri junto com seu filho. Sua cabeça seria levada para
Nobunaga, que não a receberia com alegria, e sim com lágrimas ao ver a cabeça
de um inimigo, sim, mas também um grande comandante. E assim termina a história
de Takeda Katsuyori, supostamente nascido de uma raposa disfarçada de uma bela
mulher, herdeiro do lendário Takeda Shingen, mas que se mostraria indigno de
sucedê-lo.
Essa batalha foi mostrada de forma cinematograficamente magnífica no filme “ Kagemusha”, de Akira Kurosawa.
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