Texto do vídeo: Ni no Kuni (#3) - Mononoke Hime
Agora
eu vou falar sobre o que eu considero ser o melhor filme do Miyazaki, o
Mononoke Hime, ou Princesa Mononoke, que também é um dos meus filmes favoritos.
E o cenário é bem propício, uma dungeon em uma floresta. Acho que resumir o
enredo não faz muito jus ao filme, mas vamos começar com isso. O filme basicamente
conta a história de um jovem, Ashitaka, que foi amaldiçoado após matar um
demônio, por assim dizer, e precisa partir em jornada para descobrir uma
maneira de se curar.
A
maior virtude do filme é a história, não tanto pelo enredo, pela sequência de
eventos, mas por um elemento muito raro de se ver em outras histórias do
gênero. O filme não é maniqueísta, não mostra uma luta de uma força do bem
contra uma força do mal. O conflito básico do filme é entre os humanos,
liderados por Lady Eboshi, e os animais divinos, como lobos e javalis que falam
como humanos. Eboshi criou uma cidade onde é produzido aço e ela passa por cima
da natureza e entra em conflitos com os lobos, incluindo uma humana criada
entre eles, San, e os javalis. O demônio que amaldiçoou Ashitaka era um deus
javali transformado em demônio por um tiro desferido em conflito com Eboshi,
que utiliza armas de fogo.
Por
essa descrição, pode parecer que Eboshi está errada, mas a verdade é que a
cidade traz muita prosperidade e segurança para seus habitantes. Ela acolheu
todo tipo de gente que seria marginalizada em outros lugares, como homens com
lepra e prostitutas, que trabalham para Eboshi, os leprosos na fabricação de
armas, as mulheres na fabricação do aço. E os animais são tão violentos em
relação aos humanos quanto os humanos são para defender a sua cidade. No meio
disso tudo, temos o personagem principal que tenta achar uma solução pacífica
ao mesmo tempo em que busca a cura para a sua maldição.
Ou
seja, um tema frequente nos filmes do Miyazaki, o meio-ambiente, é tratado aqui
de uma maneira muito mais equilibrada que em outras obras, que geralmente
escolhem um lado e acabam passando uma mensagem demagógica. Temos dois lados
com interesses legítimos que acabaram entrando em violento choque. Eboshi é uma
líder muito admirada por seus seguidores e tornou a vida de pessoas que seriam
párias em outros lugares muito melhor. Faz isso por interesse próprio, sim, mas
seus negócios acabam tornando a vida de todos os humanos melhor. Porém, ela não
tem qualquer escrúpulo de passar por cima da natureza, que revida com a mesma
força. Tirando a parte dos espíritos da floresta, o filme não mostra a natureza
como uma força boazinha, e sim como uma força implacável. A natureza não fica
passiva diante do avanço humano e vai revidar e esse é o grande conflito do
filme, o conflito entre progresso e conservação.
Ou
seja, não temos violões e mocinhos nesse filme, diferente de quase todas as
demais obras de qualquer mídia. Aqui não é nem que o lado mais candidato a
vilão, o da Eboshi, seja retratado de uma forma benevolente, compreensiva,
mostrando os motivos para ela ser má. Ela simplesmente não é totalmente má e os
javalis e lobos não são totalmente bons. Se for para eleger um vilão, é o
governo do Japão que puxou as cordinhas para forçar esse conflito.
O
personagem principal, o Ashitaka, ele tem uma boa relação com os dois lados e o
lado dos humanos não é retratado apenas pela líder, a Eboshi, que pode parecer
mais antipática para alguns, mas também por outros personagens como um que ele
salvou depois de um ataque dos lobos e as mulheres da vila da Eboshi. E também
se dá bem com os lobos, principalmente com a humana-lobo, a princesa Mononoke
do título. Ashitaka e San chegam a fazer um casal, embora, por conta dos
eventos do final do filme, eles acabam não ficando junto, assistam para
entender porque.
Isso
tudo vem com cenas de ação muito bem feitas e até bastante realistas, com
decapitações, braços arrancados (por flechas!, o que já não é tão realista) e
tudo o mais. O filme tem um ritmo muito bom, não tendo longas sequências de
diálogos como um filme que aborda o assunto da maneira que descrevi poderia
fazer.
A
trilha sonora do Joe Hisaishi é uma das melhores dos filmes do Miyazaki,
principalmente o tema de encerramento e que toca em outro momento muito bonito
do filme antes de um diálogo entre Ashitaka e a mãe da San.
Em
suma, por um lado é um filme muito divertido de assistir, tem um bom enredo que
prende o espectador e boas cenas de ação, entrecortadas por cenas mais
reflexivas. Mas, além de ser um bom entretenimento, é um filme interessante por
não pintar tudo de preto e branco e colocar um conflito sem heróis e vilões, o
que não é tarefa fácil.
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