quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Manual do Ditador (#12) - O que fazer?




No capítulo nove do livro O Manual do Ditador, os autores terminaram a análise sobre a política em autocracias e democracias. O último capítulo do livro pergunta: o que há a ser feito  a partir disso?

E aqui temos que ser realistas. Os autores foram ao longo do livro realistas e até um tanto cínicos, mas assim é que é a política. Nesse capítulo, procuram analisar como as coisas poderiam ser na política, mas mantendo um pé no chão.

Pelo que vimos ao longo da série, os apoiadores essenciais preferem uma coalizão vencedora pequena para dividir em menos gente as recompensas privadas que obtém. Porém, países governados por autocracias tendem a ser mais pobres. Conforme a coalizão vencedora se expande, os líderes precisariam investir mais em bens públicos para aumentar o bem-estar da população e a produtividade do país pode crescer com um governo mais democrático, fatores que também beneficiariam as pessoas que fazem parte da coalizão.

O segredo para a democratização é a coalizão vencedora se expandir. Quanto maior o grupo de apoiadores se torna, mais os essenciais passam a considerar como positivos os benefícios de continuar a expandir a coalizão. Mais importante de tudo, eliminar apoiadores essenciais passa a exigir cada vez mais mortes para que se chegue ao número ideal na mente dos líderes e dos essenciais. Se isso ocorrer e a pessoa sobreviver, ótimo. Mas os essenciais sabem que quando a coalizão cresce, a chance do seu nome estar na lista do expurgo é grande, então eles não estão tão dispostos a apoiar uma eliminação de apoiadores.

Dessa forma, precisamos analisar as aspirações da coalizão vencedora, pois eles são a fonte de mudanças positivas ou negativas. Os essenciais podem reagir a uma revolução e a controlá-la ou participar dela, e vão decidir qual é o caso com base no que é melhor para eles. A boa notícia é que aumentar a coalizão é menos arriscado para os apoiadores essenciais, já que perder privilégios é ruim, mas perder a cabeça com a redução da coalizão é ainda pior.

O melhor momento para uma democratização é quando o líder ou é muito novo ou já está em um estado de saúde tão ruim que não demorará a haver uma mudança de poder. Não só por causa da transição, mas também porque o risco de ser expurgado é maior durante trocas de regimes.

Crises econômicas também são momentos propícios para mudanças. O dinheiro para pagar os essenciais é menor, o que no limite força o líder a conceder liberdades econômicas para a população, mas também pode dar incentivos para um expurgo, para reduzir o número de pessoas cujo apoio deve ser comprado e assim aumentar o prêmio individual. Temendo isso, os apoiadores essenciais podem ser favoráveis a um aumento na coalizão vencedora, ruim para o bolso, mas bom para a saúde. Um apoiador em específico pode adotar a dianteira porque sabe que o momento é bom e que outros o farão se ele não fizer.

Dessa forma, chefes novos, morrendo ou falidos são uma ameaça para os essenciais. Nessas condições, massas e apoiadores essenciais podem se juntar para a realização de mudanças de regime. A Primavera Árabe é um exemplo disso, as massas tomando as ruas e alguns dos apoiadores, incluindo o exército, ponderando que era melhor deixar a mudança ocorrer do que se arriscar e se opor a ela.

Nesse ponto, os autores fazem uma pausa na análise política e passam para o mundo dos negócios e a governança. E começa analisando o caso do Green Bay Packers, um time da NFL, a liga de futebol americano, que está sediado em uma cidade com 100 mil habitantes e tendo 112 mil acionistas. É o único time da NFL sem fins lucrativos e que tem como donos a própria comunidade de Green Bay e redondezas. Há um limite no número de ações que uma pessoa pode ter, o que impede que alguém ganhe muito poder político, e o conselho de administração tem 43 membros. Ou seja, o time tem tanto um grande número de intercambiáveis quanto uma coalizão vencedora grande.

Para empresas, o que os autores sugerem é justamente dar mais poder aos acionistas minoritários. As redes sociais estão participando ativamente das revoltas e protestos mundo afora e os autores sugerem que esse é o caminho. Nos Estados Unidos, a base acionária das empresas é mais dispersa, com milhões de acionistas com pouco poder político isoladamente. Esses pequenos acionistas possuem menos acesso a informações e na verdade não parecem se importar muito em exercer os seus direitos políticos.

A solução para esse problema é a área de relações com investidores, que busca a comunicação entre os investidores e a empresa. Há muitas iniciativas boas em Relações com Investidores no Brasil e no exterior, mas isso não parece ser suficiente para engajar mais os investidores. Uma coisa que não se vê é algum tipo de fórum de discussões ou um blog para que os acionistas pessoa física de uma empresa se comuniquem e possam se mobilizar.

Está certo que líderes empresariais fazem de tudo para dificultar a ação dos minoritários, mas, diferente dos líderes políticos, não dispõem de poder de polícia para reprimir os seus intercambiáveis. Iniciativas que fizessem com que os minoritários se mobilizassem podem ter o mesmo efeito renovador que manifestações por liberdades políticas poderiam obter, de forma a tornar os líderes mais responsáveis com seus principais, com as pessoas que eles representam.

Voltando ao mundo político, os autores analisam a história dos Estados Unidos e como melhorar as democracias. Eles questionam as análises de que o norte era mais próspero por causa do clima ou da escravidão. Um estudante deles realizou o cálculo do tamanho da coalizão vencedora estado a estado e determinou que no norte o número de apoiadores essenciais em relação à população era maior.

Os autores ainda retomam a discussão sobre o desenho dos distritos, um tema bastante polêmico nos Estados Unidos e que permite reduzir o número necessário para ser eleito nos Estados Unidos. Sugerem acabar com o gerrymandering e também o colégio eleitoral e a eleição indireta. Sugerem também flexibilizar as regras de imigração, que na verdade é historicamente um dos motivos para que os Estados Unidos tenham se desenvolvido. Além do mais, pode servir para aumentar a coalizão vencedora e forçar os líderes a se preocupar mais com o bem-estar da sociedade.

Para ditaduras, mudanças podem ocorrer por dentro ou por fora. A maneira mais eficiente e com mais chance de sucesso é que isso ocorra por dentro. E o ambiente mais propício para a queda de um regime é uma crise econômica quando o líder depende do dinheiro dos impostos para se manter no poder. Países turísticos são especialmente vulneráveis a mudanças, especialmente em tempos recentes. Para atrair turistas e ganhar dinheiro, o líder precisa conceder infraestrutura e liberdades, inclusive a de reunião e comunicação. Essas liberdades acabam se voltando contra o governo, como vimos na Tunísia e no Egito, dois países que dependem do turismo.

As democracias que genuinamente desejem democratização podem influenciar esse processo impondo condições para a ajuda externa, como a de fornecer infraestrutura de comunicações. Isso pode ser bom para o líder, na medida em que aumenta a produtividade da economia. Beneficia a população também, as comunicações melhorando a vida econômica das pessoas e dando as condições para uma revolta. Se o líder se recusar a aceitar a tecnologia, vai estar sinalizando para os doadores de ajuda externa que não é um líder político confiável. Outras condições podem ser impostas, como metas a serem cumpridas pelo país beneficiário, inclusive em termos de liberdades políticas.

Para ditaduras que podem se manter com recursos naturais, a questão é mais complicada, já que esses países não precisam fornecer muitos bens públicos para arrecadarem os recursos necessários para o líder se manter no poder. O jeito é esperar que a revolta política surja de dentro do país e oferecer anistia ao líder. Isso pode parecer estranho e até injusto, mas anistiar o líder de uma ditadura pode ser efetivo para tirá-lo do poder sem maiores derramamentos de sangue. E mesmo a mera proposta pode ser efetiva, já que os apoiadores essenciais vão desconfiar que o líder pode escapar a qualquer momento e retirar o apoio a ele. Porém, isso depende de ocorrer uma situação em que essa barganha possa ser mais efetiva.

Eleições, por si só, não são a solução. Mesmo que não haja manipulação de votos, mesmo que as pessoas possam votar livremente, de nada adianta se o partido no poder puder manipular o processo eleitoral para reduzir as chances da oposição ou até mesmo eliminar opositores fortes. Eleições nesse caso só aumentam a base de intercambiáveis (que é bom para o líder ao deixar desconfortável os seus apoiadores próximos) e servem para dar legitimidade ao líder aos olhos da comunidade internacional e entrincheira-lo ainda mais.

Bom, esse é o fim do livro O Manual do Ditador. O livro mostra alguns conceitos importantes sobre política e explica como líderes se comportam em democracias e autocracias dependendo de quantas pessoas ele precisa satisfazer para se manter no poder. A série terá mais um capítulo para eu mostrar o final dessa missão do Tropico 5, só não sei ainda sobre o que exatamente vou falar nesse próximo vídeo.

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