quinta-feira, 22 de maio de 2014

Conquista Espanhola (#6) - Colonização Espanhola


Na continuação da série sobre América Latina, vou falar sobre aspectos da colonização espanhola da América Latina. A fonte de informação é o livro The Penguin History of Latin America. A gameplay é do jogo Expeditions: Conquistador.

A colonização da América Latina teve como uma das principais características a descentralização. Não foi uma guerra de conquista empreendida por um exército formal, mas uma série de expedições autorizadas pela Coroa Espanhola que atraiu milhares de aventureiros em busca de ouro e fama. Por conta disso, não foi uma empreitada sistemática e organizada, havendo muito improviso nas operações e na fundação de cidades. O determinante para o estabelecimento de assentamentos e a exploração foi a busca por ouro e por mão-de-obra. Isso levou os espanhóis a áreas já dominadas por outras civilizações, como os astecas e os incas. Fora disso, ou não havia riquezas a se apropriar ou o local era de difícil exploração, como o alto dos Andes.

Os espanhóis começaram a fundar cidades próximas de áreas já densamente povoadas por indígenas e só depois gradualmente foram povoar outras áreas. Boa parte do interior da América do Sul só seria explorada quatro séculos depois da chegada ao Novo Mundo. Ao leste dos Andes, apenas algumas áreas da Argentina, Paraguai, Venezuela e Chile foram povoadas.

Ao longo da colonização, os espanhóis se defrontaram com indígenas de vários tipos, seguindo diferentes esquemas de desenvolvimento, indo de tribos sedentárias da Nova Granada a sociedades mais complexas como os maias, tribos semi-nômades como os araucarians do sul do Chile e os Chichimec do norte do México e tributos de caçadores e coletores na Floresta Tropical da América Central e Sul. A interação dessas tribos com os espanhóis influenciaria a sociedade que emergiria nessas localidades.

Dessa forma, a colonização espanhola foi limitada, dispersa e heterogênea. Mesmo assim, havia uma conexão entre as principais áreas de colonização, ao norte a Cidade do México, ao sul Lima. Os espanhóis preferiram estabelecer cidades longe das costas, que são mais vulneráveis a doenças e ataques pelo mar, mas havia portos auxiliares em Veracruz no Golfo do México, Callao no Pacífico e Portobelo no Panamá. Santiago do Chile era ligada ao Pacífico e à Lima por Valparaíso e Quito pelo porto de Guayaquil. A rede de transportes passou a incluir outras cidades quando a mineração de prata ganhou fôlego, a Cidade do México se ligando a Zacatecas, Lima à Cuzco e La Paz à Potosí. Dessa forma, prata vinha do interior para Lima e Cidade do México e depois exportadas para a metrópole e produtos europeus partiam de Sevilha e seguiam a mesma rota ao longo da colônia.

Essa foi uma maneira eficiente da Coroa manter controle sobre as colônias. Essa estrutura básica existe desde o século XVI e foi ramificando as suas extremidades conforme o império crescia. Essa foi a maneira da Coroa manter controle sobre a colônia sem abrir mão de terceirizar a exploração para os expedicionários, que agiam sem a supervisão do governo, mas, uma vez sendo bem sucedida, se incorporando ao império. No fim, era uma mistura de iniciativa local com autoridade centralizada que se exerce através de uma rede de comunicações organizada.

Na organização social da colônia, denominava-se adelantado o chefe do grupo de conquistadores. Ele era assumia o papel de capitão-geral ou governador, sendo responsável pela defesa militar e a administração civil. Ao adelantado era permitido distribuir recompensas aos seus comandados, a concessão de terras podendo ser de peonías com cerca de 100 acres para soldados rasos e caballerías com cerca de 500 acres para cavaleiros. O adelantado era obrigado a fundar cidades de uma maneira bem ritual pagando tributo à Coroa e à Igreja. Uma espada deveria ser cravada em uma árvore para simbolizar a implementação da justiça real no território, o nome da cidade seria proclamado com gritos de “Viva el Rey!” e uma missa seria celebrado para santificar o local.

O direito à mão-de-obra indígena e de cobrar tributos dos índios está na instituição da encomienda, concedida à elite dos exploradores. A Coroa teve o cuidado de não criar senhores feudais já que a encomienda não transforma os índios em servos.

Os espanhóis que escolhiam se estabelecer na cidade seriam considerados vecinos (cidadãos) de uma municipalidade espanhola e teriam o direito de eleger o comandante militar e seriam vassalos do rei da Espanha. Dentre os mais importantes vecinos, aqueles com as maiores encomiendas, o adelantado escolheria um conselho municipal, o cabildo. O notário real e o padro que acompanhavam as expedições se tornariam o magistrado e a autoridade eclesiástica na cidade. Assim, os órgãos essenciais da Espanha eram replicados na colônia. Inclusive, a construção da cidade em seu início devia seguir um plano pré-definido, a traza, com uma área retangular sendo traçada no centro da cidade ao redor da qual eram construídas a residência do governador, o cabildo, a igreja, a prisão e a casa dos principais encomenderos. Da praça, oito ruas paralelas dividem a cidade em grades de casas, quanto mais longe a casa estando da praça, menor a posição social de seu dono.

A princípio, a economia das colônias era voltada para a autossuficiência, mas depois passou a se voltar a estabelecer ligações comerciais e administrativas com outras cidades e depois com a metrópole, alguns colonos se especializando em bens como açúcar e tabaco para exportação.

A conquista do Novo Mundo não foi uma empreitada aristocrática, a grande maioria dos participantes vindo das classes baixas, artesão, soldados, marinheiros etc. em busca de fama e dinheiro nas expedições. Apesar de todos os esforços da Coroa para colocar ordem na colônia, a vida no Novo Mundo era instável e perigosa por conta da supervisão à distância da metrópole. O fluxo de migrantes vindo para as Américas piorou essa situação ao colocar colonos em conflitos pelos melhores territórios.

Apenas 6% dos migrantes para o Novo Mundo eram mulheres, então restava as indígenas para os espanhóis terem relações. A Coroa e a Igreja estimulavam a oficialização dessas relações no casamento, e de fato muitos seguiram por esse caminho, mas a maioria viveu no pecado mesmo. Quando mais mulheres passaram a vir da Europa, elas se tornaram as parceiras preferenciais para casamento, não que os espanhóis abandonassem de todo as relações ilícitas. Havia um grande preconceito racial e os filhos brancos costumavam ser reconhecidos, ao contrário dos não-brancos.

Do lado dos nativos, havia uma grande heterogeneidade entre os vários grupos indígenas, de forma que classificar todo mundo como “índio” é simplificador demais. Ajuda a distinguir entre dois grupos extremamente diferentes (nativos e europeus), mas esconde a grande diversidade que havia mesmo nas áreas dominadas por incas ou astecas.

Há uma tendência a ver a conquista espanhola como uma violência desmedida dos espanhóis contra inocentes indígenas. Embora os espanhóis tenham cometido barbaridades no Novo Mundo, indo do trabalho forçado a massacres e estupros, as expedições não foram mais violentas do que muitas guerras entre europeus e até entre indígenas. Não havia uma enorme comunidade indígena coesa, unida e pacificada, e sim várias tribos que entravam em conflito entre si e até internamente, os incas e os astecas estando em guerra civil quando os espanhóis chegaram na América Latina.

Após a chegada dos espanhóis, a população indígena foi bastante diminuída, mas nem tanto por massacres indiscriminados e mais por doenças trazidas do Novo Mundo. Que foram devastadoras, sem dúvida, algumas estimativas chegando de redução da população nativa chegando a terríveis 90% no México e 40% no Peru. As doenças não só matavam, mas também abaixavam o moral, desnorteavam os indígenas, que não sabiam o que estava acontecendo, e desestruturava o poder, já que muitos líderes forma mortos dessa maneira. Aqueles que sobreviveram tiveram que lidar com a desmoralização social, com relatos de um diversos casos de suicídio, abortos, falta de vontade e procriar e alcoolismo se disseminando entre os indígenas.

A cobrança de impostos dos indígenas foi outra consequência negativa da colonização espanhola, mas não se sabe se esses impostos eram maiores ou menores do que os cobrados pelos incas ou os astecas, mas houve casos de indígenas fugindo de vilas dominadas por esses impérios para trabalhar para os espanhóis. Mas é provável que os impostos fossem excessivos, já que a população indígena diminuiu (reduzindo a produtividade) ao mesmo tempo em que a população espanhola aumentou (aumentando as exigências). Outra questão é que havia certa reciprocidade entre dominados e dominadores antes da conquista, e os espanhóis não davam muito em contrapartida aos tributos recebidos. Houve também uma série de deslocações forçadas de populações de áreas menos densamente povoadas e distante de onde os espanhóis precisavam de mão de obra para áreas mais próximas dos campos de trabalho.

E apesar dos espanhóis dominarem os nativos, houve uma certa continuidade cultural em relação ao período pré-hispânico e quem mais teve a lamentar da derrota contra os espanhóis eram as aristocracias dos impérios inca e asteca, que perderam o poder que tinham. E, conforme comentado anteriormente, havia uma série de conflitos entre facções rivais nos impérios, que se aliaram aos espanhóis para derrotar seus inimigos. E havia ainda aqueles que optaram por se aliar aos espanhóis em tempos de paz, e esses sofreriam menos nas mãos dos espanhóis. Outros, como os araucarians, conseguiram resistir por muito tempo. Muitas etnias eram subjugadas pelos incas e astecas e a queda dos impérios significou a libertação dessas etnias.


Muito da estrutura básica da vida indígena permaneceu mais ou menos a mesma em boa parte, desde que eles aceitassem seus novos mestres. O que não significa que a relação foi pacífica, e os espanhóis e os indígenas entraram em choque em vários momentos, inclusive com vitórias para os índios, mas essa não era uma situação permanente. Na religião, havia um sincretismo entre as crenças antigas e o cristianismo, o que se manifestou, por exemplo, no Dia dos Mortos mexicano. Culturalmente, os nativos mostraram grande capacidade de resistência e de escolha entre os elementos da cultura estrangeira que eles queriam assimilar. Rituais, respeito à autoridade tribal, formas de organização familiar e a economia familiar de antes da conquista permaneceram após a chegada e dominação dos espanhóis. Os espanhóis empurraram o cristianismo para os nativos, mas aceitaram as tradições que fossem compatíveis com o cristianismo por interesse de estado e tentaram conciliar as duas culturas em muitos aspectos.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Conquista Espanhola (#5) - Outras conquistas


Na continuação da série sobre América Latina, vou falar sobre outras conquistas. A fonte de informação é o livro The Penguin History of Latin America. A gameplay é do jogo Expeditions: Conquistador.

Assim como a conquista do México motivou vários exploradores a procurar por riquezas na América Latina, a conquista do Peru provocou nova sanha por conquistas. Nas décadas de 1530 e 1540, as áreas mais populares eram ao norte do Império Inca nas regiões da Venezuela, Colômbia e Equador. Sebastián de Benalcázar, após a conquista de Quito, se infiltraria no território dos índios Chibcha e fundaria Popayán em 1536 e Cali em 1537. Enquanto ele se aproximava de Bogotá, a capital do reino Chibcha, ele encontrou outros exploradores espanhóis, como Gonzalo Jiménez de Quesada, que tinha conquistado o reino Chibcha de Tuja e Nikolaus Federmann, um alemão autorizado por Carlos V a ir à América Espanhola. Ao invés de entrarem em conflito, os três exploradores fizeram um acordo e aceitaram a arbitragem da coroa, que decidiu em favor de Benalcázar.

Havia rumores de uma terra além dos Andes cheia de ouro onde o rei se cobriria com pó de ouro e tomaria um banho em um lago sagrado uma vez por ano. Guiado pela lenda de El Dorado, Gonzalo Pizarro partiu em 1541 pelos Andes através da floresta tropical. Desesperado por comida, Gonzalo enviaria um grupo para procurar por comida liderada por Francisco de Orellana. Gonzalo retornou para Quito, mas Orellana se perderia por um longo rio que ele percorreu em toda a sua extensão antes de ir para Hispaniola. O rio seria chamado de Amazonas por conta dos ataques de guerreiras sofridos por Orellana.

No México e no Caribe, os exploradores foram atrás da lenda equivalente de El Dorado ao norte, as Sete Cidades de Cíbola, cujos prédios teriam ouro e turquesas encrustados. Esses rumores seriam aumentados por um relatório de Alvar Nuñez Cabeza de Vaca, que teria visto um poderoso império ao noroeste do México. Cabeza de Vaca tinha partido em uma expedição para conquistar a Flórida em 1528 que foi mal fadada por doenças e ataques de índios e ele foi um dos poucos sobreviventes. 8 anos depois, ele continuaria explorando a região da Flórida, chegando na Cidade do México em 1536. Quatro anos depois, seguiria com nova expedição que o levaria para o Brasil e até o Paraguai, onde ele se tornaria governador de Asunción.

Em 1540, a busca pelas Sete Cidades de Cíbola seria empreendida por Francisco Vasquez de Coronado no que hoje é o Novo México e o Arizona. Não encontrando nada lá, foi mais para o leste e descobriu o Grand Canyon e seguiu pelo Rio Grande no Texas. Ouvindo falar sobre lendas a respeito de outra terra de ouro, Quivira, partiria em segunda expedição que o levou para Oklahoma e Kansas. Não encontrou o que queria, mas expandiu os territórios conhecidos na América do Norte.

Outro grande explorador foi Hernando de Soto, que participou da conquista do Peru com Francisco Pizarro. Em 1539, partiu em expedição para mais uma tentativa de explorar a Flórida, não encontrando nada. Em seguida, foi para Georgia, Alabama e Louisiana, descobrindo o rio Mississipi até morrer em 1541. Esses e outros territórios se tornaram formalmente parte do Império da Espanha, mas não se tornariam povoados até a colonização inglesa. Na América do Sul também haveria enormes territórios que demorariam para ser explorados, como parte do Brasil, os pampas argentinos e a Patagônia. Tentativas de estabelecer assentamentos no rio Paraguai e Paraná só foram bem-sucedidas no final do século XVI.

Desde cedo, o Rio da Prata era de interesse dos colonizadores. Em 1516, Juan Díaz de Solis começou a exploração, mas morreu nas mãos (e bocas) de canibais. Magellan também tentou em 1520 antes de ir para o sul e descobrir o estreito que leva o seu nome. O explorador veneziano Sebastian Cabot a serviço da Espanha chamaria de Rio de la Plata achando que encontraria prata. Só em 1535 que haveria uma tentativa de estabelecer um assentamento no Rio da Prata em expedição liderada por Pedro de Mendoza, que fundaria a cidade de Santa María de los Buenos Aíres, destruída por índios em 1541. A única cidade espanhola ao leste dos Andes seria Asunción, fundada por Mendoza.

O balanço final das expedições até 1540 era desfavorável, com muito sangue derramado, inclusive de espanhóis, poucas expedições realmente bem sucedidas e muito trabalho em pacificar as áreas dominadas. A conquista de Yucátan começou em 1527, mas até a década de 1540 os espanhóis estavam lutando contra índios insurgentes. A parte oeste e noroeste do México levou entre 1529 e 1575 para ser dominada até a criação de Nueva Viscaya por Francisco de Ibarra.

A conquista do Chile começou em 1540 com Pedro de Valdivia partindo de Cuzco para dominar a parte sul do império inca que Diego de Almagro não tinha conseguido conquistar cinco anos antes. Demorou um ano inteiro para atravessar os Andes e o deserto do Atacama. Em 12 de fevereiro de 1541, Valdivia fundaria a cidade de Santiago, destruída seis meses depois por índios araucarian. Por dois anos, Valdivia se manteve em Cerro Santa Lucia em uma ilha do rio Mapocho até receber reforços do Peru. Depois que Santiago foi refundada, os espanhóis continuaram a sul, fundando Concepción e Valdivia, mas não conseguiram cruzar o rio Bío-bío, protegido por índios araucarian que matariam Valdivia.

Do Chile, os espanhóis foram para o que hoje é a Argentina, fundando as cidades de Mendoza e San Juan, extensões da colônia do Chile. Mais tarde, Córdoba e Tucumán seriam fundadas por expedições do Peru. Em 1580, Buenos Aires seria refundada por expedições vindas do Paraguai. Todos esses assentamentos seriam entrepostos do império dependentes da economia do Peru. Pela maior parte da era colônia, a Argentina não existia como uma entidade própria, sendo até o século XVIII meramente um porto para comércio ilegal de escravos e prata com mercadores portugueses.

Vantagem Espanhola
Vou falar agora sobre os motivos que levaram os espanhóis a terem uma vantagem tão grande sobre os índios, inclusive sobre os impérios Astecas e Inca, apesar de serem em tão menor número. Na parte militar, eles tinham armas, armaduras e navios, porém, na maior parte das vezes os exploradores eram mal equipados. O próprio Cortés só tinha 13 armas e 15 canhões quando chegou no México. O terreno difícil também anulava muitas dessas potenciais vantagens. Cavalos também eram uma arma importante dos espanhóis, recurso que os índios não possuíam, mas, novamente, Cortés só tinha 16 cavalos e Pizarro 27. A cavalaria não foi fator tão crítico assim nas conquistas espanholas.


Uma vantagem importante dos espanhóis foi no campo da política e da estratégia militar. Os espanhóis conseguiram explorar rivalidades locais para seu favor para ganhar aliados locais e dividir para reinar. Outras vantagens foram os vírus trazidos do Velho Mundo que serviram como arma biológica. Apesar do efeito inverso tenha ocorrido, os espanhóis sendo expostos a novas doenças e inclusive as exportando para a Europa, os índios foram os mais afetados. Na parte estratégica, os espanhóis sabiam exatamente o que queriam (riquezas), mas os índios não sabiam o que esperar dos invasores. Eles pensavam que podiam apaziguar ou satisfazê-los até que eles partissem, e quando viram que os espanhóis vieram para ficar e se organizaram para repelir os invasores já era tarde demais. A essa altura, eles já estavam desestruturados demais para organizarem uma força de resistência coesa para enfrentar os espanhóis. Aqueles que, como os araucarians, já estavam organizados, que sempre foram hostis aos espanhóis e que se adaptaram ao inimigo, aprendendo a usar cavalos, por exemplo, sobreviveram por séculos até serem sobrepujados pelos europeus. Se os astecas e os incas tivessem agido assim, não teriam sido derrotados pelos espanhóis.

terça-feira, 20 de maio de 2014

Conquista Espanhola (#4) - Conquista do Peru


Na continuação da série sobre América Latina, vou falar sobre a Conquista do Peru. A fonte de informação é o livro The Penguin History of Latin America. A gameplay é do jogo Expeditions: Conquistador.

Francisco Pizarro e Diego de Almagro receberiam do governador de Castilla del Oro, Pedro Dávila, a permissão de explorar a América do Sul enquanto Dávila estava mais ocupado mais ao norte, esperando encontrar uma nova civilização mais perto de onde Cortés encontrou os astecas.

Pizarro e Almagro esperavam encontrar a lendária terra de Birú, onde haveria um grande estoque de ouro. Uma primeira expedição em 1524 fracassaria, mas uma segunda em 1527 chegaria até Tumbes, no nordeste do Peru, trazendo de lá itens de ouro e prata que indicariam uma grande civilização. Em 1528, Pizarro enviaria um pedido à Espanha para conquistar e depois explorar o Peru independente de Pedro Ávila. Na volta, trouxe um grande número de reforços, que se juntariam àqueles recrutados por Almagro na colônia do Panamá.

Tanto Pizarro quanto Almagro eram conquistadores experientes na casa dos 50 anos, uma idade avançada para a época, ainda mais na atividade deles. Pizarro tinha participado de várias expedições antes, incluindo aquela que descobriria o Oceano Pacífico em 1513 liderada por Vasco Nuñes Balboa. E, ao contrário de Cortés, era um homem chucro e semiletrado. Almagro não era muito melhor nesse sentido. E a parceria estremeceu depois da volta de Pizarro da Espanha, Pizarro conseguindo para si o título de Governador e Capitão-Geral do Peru, enquanto Almagro ficaria com o governo da cidade de Tumbes. Apesar disso, eles continuaram a parceria, mas o ressentimento permaneceria e explodiria mais para frente.

Em 1530, Pizarro lançaria a expedição, com 180 homens e 27 cavalos. Desembarcou na costa do Equador e começou marcha até Tumbes, que seria acidentada por doenças e ataques de índios. Chegando em Tumbes, descobriram que o Império Inca estava em convulsão interna provocada pela morte do imperador pela varíola trazida pelos espanhóis. A disputa pela sucessão envolvia Huascar, filho do antigo imperador, e Atahuallpa, meio-irmão dele que iniciou a rebelião. Quando Pizarro chegou, Atahuallpa estava a caminho da cidade sagrada de Cuzco, onde suas tropas mantinham Huascar prisioneiro.

Pizarro descobriria que Atahuallpa estava em Cajamarca, uma cidade que estava abandonada por conta da guerra civil. Pizarro então iria atrás de Atahuallpa para captura-lo como Cortés havia feito com Montezuma. Em novembro de 1530, Pizarro chegou em Atahuallpa e lá se acomodou, convidando Atahuallpa para um encontro. Os emissários espanhóis tentaram impressionar os incas com cavalos, o que deve ter dado certo, já que cavalos eram desconhecidos pelos nativos.

Atahuallpa chegou em Cajamarca com 80 nobres escoltados por 6 mil soldados. Ele entrou na cidade, mas não encontrou ninguém, vendo nisso um sinal de medo por parte dos espanhóis. Até que apareceu o padre Vicente de Valverde, que leu o Requerimento para Atahuallpa, estabelecendo a soberania da coroa espanhola e o ensino do cristianismo. Atahuallpa, obviamente, rejeitou e mandou atacar. Mas já tinha caído na armadilha, com os espanhóis atacando de canhões instalados nos prédios e com cavalos que estava ocultos. Com poucas centenas de homens, Pizarro destruiu um exército bem superior de incas.

Atahuallpa além de subestimar os espanhóis, entendeu errado as suas intenções. Ele não imaginava que os espanhóis queriam dominar o Império, pensava que eles estavam meramente atrás de ouro. Por isso, ofereceu uma grande quantia de ouro aos espanhóis a título de resgate, aceita de bom grado por Pizarro. No cativeiro, Atahuallpa ordenaria a execução de Huascar, para que ele não aproveitasse a situação para tomar o poder.

Os espanhóis esperaram oito meses pelo resgate. Em Cajamarca, eles estavam em uma situação delicada, vulneráveis a ataques dos incas caso eles decidissem agir. Para reduzir as forças incas, Pizarro persuadiu que um dos generais, Chalcuchima, visitasse o imperador cativo e fez dele prisioneiro também, enfraquecendo ainda mais a estrutura de poder dos incas.

O resgate chegou, mas Atahuallpa não foi libertado. No planejamento do ataque à Cuzco, Pizarro e Almagro discutiam sobre o que fazer com o imperador, até que Pizarro finalmente se convenceu a estrangulá-lo (a discussão era sobre se matava ou não, e não sobre o método de execução). Essa decisão repercutiria muito mal até na Coroa Espanhola, que exigia alguns parâmetros éticos mínimos e preferiria que Atahuallpa fosse exilado.

Na conquista de Cuzco, Pizarro usou a estratégia do “dividir e conquistar”, valendo-se da disputa pelo poder que eclodiu em Cuzco após a morte de Atahuallpa. A família de Huascar se aliou aos espanhóis e pretendiam recuperar o poder que foi usurpado deles. Pizarro se apresentaria como o restaurador da legítima linha de sucessão aos nativos e com isso esperava obter apoio de uma das facções em guerra. Ele fez com que um dos irmãos de Huascar, Tupcac Huallpa, fosse escolhido imperador e assim ele chegasse em Cuzco como um libertador.

Mas a estratégia deu errado quando o novo imperador morreu. No caminho até Cuzco, Pizarro teve que enfrentar os incas em batalha aberta. Mas um novo imperador fantoche foi escolhido (Manco Inca, irmão do falecido) e Pizarro conseguiu vencer as tropas incas do outro lado da guerra civil que estava contra ele. Em novembro de 1533, Pizarro chegou em Cuzco e iniciou a pilhagem que tanto ansiava.

Mas a conquista ainda não estava completa. Faltava capturar Quito, cidade natal de Atahuallpa e de onde vinha a maior parte da resistência. Ao sul, restava territórios que hoje fazem parte da Bolívia e do Chile. Havia ainda questões a resolver, como a dominação completa de Cuzco e as divergências entre Pizarro e Almagro, este se ressentindo do tratamento preferencial dos irmãos de Pizarro e por não ter recebido a sua parte do resgate de Atahuallpa.

A conquista das províncias do norte de Quito foi feita por um dos tenentes de Pizarro, Sebastián de Benalcázar, que teve que disputar território com outros conquistadores espanhóis como Pedro de Alvarado. Os dois exércitos espanhóis entraram em conflito, até que Alvarado aceitasse recuar após receber um pagamento em ouro de Almagro. Em seguida, Benalcázar e Almagro prosseguiriam com a conquista de Quito, derrotando os aliados remanescentes de Atahuallpa.

Enquanto isso, Pizarro consolidava o domínio espanhol sobre o Império Inca. Ele construiria uma nova capital, já que Cuzco era muito longe da costa e muito alta e essa capital ficaria próxima da boca do Rio Rimac. Pizarro chamaria de Cidade dos Reis, mas logo passou a ser chamada de Lima, uma corruptela de Rimac.

Cuzco seria a principal fonte de distensões entre Pizarro e Almagro. O imperador Carlos V estabeleceria que Pizarro governaria os territórios do norte e Almagro os do sul, mas nada disse sobre Cuzco. Pizarro convenceria Almagro a ir explorar os territórios ao sul, Bolívia e Chile, mas o resultado da expedição que durou dois anos foi um desaste. Apesar de atravessar o frio dos Andes e o calor do Atacama lutando contra os índios pelo caminho, Almagro não encontrou as riquezas que estava buscando. Com isso, voltaram para o Peru querendo ainda mais Cuzco e passaram a ser inimigos declarados dos irmãos Pizarro.

Gonzalo e Juan Pizarro ficaram encarregados de cuidar de Cuzco, mas essa foi uma administração desastrosa. Os espanhóis continuaram pilhando Cuzco e convenceu o imperador fantoche Manco Inca de que os espanhóis não sairiam tão cedo, o que iniciou uma rebelião, que se espalhou por toda a região. Cuzco estava cercada com apenas 190 espanhóis e Lima também estava sob ataque. Sob o comando de Hernando Pizarro, os espanhóis resistiram como pode. Francisco Pizarro pediu reforços do Panamá, que vieram e salvaram Lima. Cuzco só seria salva de vez com a volta dos homens de Almagro, que aproveitaram para prender os irmãos Pizarro que estavam na cidade antes de ir atrás de Francisco. O Peru estava novamente em guerra civil, dessa vez entre espanhóis. Mas essa guerra civil não durou muito. Hernando Pizarro invadiria Cuzco e derrotaria os homens de Almagro e capturaria o próprio, que seria executado pouco tempo depois.

Os Pizarros eram agora os mestres do Peru, mas tinham que lidar com os seguidores de Almagro que restaram e os incas liderados por Manco. Além disso, invasores entraram no Peru atrás de ouro e a Coroa Espanhola também mostrava insatisfação com a maneira como a conquista estava sendo feita. Quando voltou para a Espanha levando ouro, Hernando Pizarro seria preso por causa da morte de Almagro. Francisco Pizarro teria pior sorte, sendo assassinado por almagristas em 1541, que proclamariam Diego Almagro como governador do Peru.

Mais uma guerra civil para o Peru, dessa vez, prontamente solucionado pela Coroa, que enviou Cristóbal Vaca de Castro com apoiadores de Pizarro para derrubar os almagristas, o que ocorreria em setembro de 1542. Dois anos depois e nova revolta, dessa vez contra o vice-rei Blasco Nuñez Vela, derrubado por Gonzalo Pizarro, que se proclamaria governador do Peru. Os irmãos Pizarros ainda tentariam a independência da Espanha proclamando Gonzalo Rei do Peru. A Coroa agiu enviando Pedro de la Gasca para enfrentar os pizarristas, os derrotando em abril de 1548 e executando Gonzalo Pizarro por traição. Isso começou um período de paz no Peru.


Mas seria ainda necessário lidar com a revolta dos incas. Manco Inca fundou um novo estado inca independente em Vilcabamba entre Cuzco e Lima, de onde ele lançava ataques contra os espanhóis até 1545, quando foi morto por almagristas. Seu sucessor, Titu Cusi foi mais comedido e procurou manter relações com os espanhóis, permitindo o batismo e a pregação do cristianismo. Mas essa experiência não duraria muito tempo e os espanhóis destruiriam esse estado neo-inca no coração de seu território e estabelecer a soberania na região. O sucessor de Titu Cusi, morto em 1571, possivelmente envenenado pelos espanhóis, seria Tupac Amaru, que acabou com a política de apaziguamento e romperia relações com os espanhóis. Isso daria ao vice-rei Francisco de Toledo o pretexto para liquidar com o estado neo-inca e em 1572 Tupac Amaru seria executado.

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Conquista Espanhola (#3) - A conquista do México


Na continuação da série sobre América Latina, vou falar sobre a Conquista do México. A fonte de informação é o livro The Penguin History of Latin America. A gameplay é do jogo Expeditions: Conquistador.

As dificuldades que Colombo teve nas suas tentativas de estabelecer colônias nas Américas não forma exclusividade sua. A questão é que houve um choque cultural muito grande de suas civilizações que nunca tiveram contato antes. Os europeus viviam em uma economia monetária usando ouro como moeda e em uma sociedade hierarquizada, enquanto que os nativos viviam em uma economia de subsistência onde o ouro era puramente decorativo. Os europeus não entendiam porque os nativos não queriam trabalhar junto ou para eles e os nativos não entendiam porque os europeus queriam tanto o ouro assim. Para conseguir ouro, os espanhóis precisavam de trabalho nativo e os índios não estavam dispostos a fornecê-lo e esse seria o conflito da colonização espanhola.

Os espanhóis tinham várias vantagens sobre os nativos, como armas melhores, inclusive uma arma biológica não intencional, que eram as doenças que eles levaram para o Novo Mundo e para as quais os nativos não estavam imunizados, e também um desejo maior por cumprir seus objetivos. Mas a “guerra biológica”, por assim dizer, atingiu os dois lados, os espanhóis também sendo vulneráveis a doenças tropicais contra as quais não estavam preparados para lidar. Para piorar, os espanhóis levados ao novo mundo não eram soldados disciplinados, e sim camponeses sem treinamento levados a essa empreitada na esperança de ganho rápido para depois voltarem para a Espanha. Não tinham escrúpulos de usar mão-de-obra indígena forçada, o que tornava os nativos ainda mais vulneráveis a doenças.

Conforme a mão-de-obra ia se tornando escassa, o estímulo para continuar explorando aumentava, e os espanhóis conquistaram Porto Rico em 1508, Jamaica em 1509 e Cuba em 1511, que viraram entrepostos comerciais de ouro, escravos e outras mercadorias. Tierra Firme começou a atrair a atenção dos espanhóis a partir de 1509. O istmo do Panamá foi conquistado em 1509 e a Flórida em 1513.

Para aumentar a mão-de-obra, Ovando usaria o mecanismo de encomienda, onde índios seriam alocados em um assentamento para trabalhar em troca de abrigo, remuneração e ensinamento na fé cristã. A Rainha Isabel continuou não gostando, já que continuava sendo trabalho forçado e porque poderia criar uma casta de senhores feudais no Novo Mundo. Em tese, encomienda era preferível à escravidão porque impunha responsabilidades ao encomendreo, mas não era tão melhor. Mas isso não resolveu nem o problema da falta de mão de obra, nem os abusos dos espanhóis.

Quando o filho de Colombo, Diego, assumiu o governo do Novo Mundo, ele estabeleceria em 1511 a primeira corte criminal em Santo Domingos para tentar coibir os abusos. Um ano antes, quatro missionários dominicanos chegaram na tentativa de ajudar na cristianização do que eles ainda chamavam de Índias.

Em 1512, Fernando II promulgaria a Lei de Burgos, estabelecendo salários justos para os índios e colocando oficiais reais para supervisionar as encomiendas. A coroa também estabeleceria que apenas os índios capturados em guerras justas poderiam ser utilizados como escravos. Isso era definitivo através do Requerimento, um documento declarando a soberania sobre os territórios e delineando os principais elementos da fé cristã. A rejeição desses termos resultava na guerra justa e foi amplamente abusada pelos caçadores de escravos. Após a morte de Fernando II, o regente Cardela Jiménez de Cisneros permitiria a importação de escravos africanos.

Com o tempo, os espanhóis se convenceriam de que não estavam nas Índias e que a tarefa em questão passaria a ser colonizar as terras que encontraram. O objetivo seria agora conquistar a Tierra Firme. Em 1513, uma expedição liderada por Pedrarias Dávilas foi organizada para conquistar a região de istmo da América Central. Em 1519, fundou a cidade do Panamá e prosseguiu a exploração em busca de Birú, um reino mítico que eles esperavam encontrar onde teria tudo que eles procuram.

Entre 1517 e 1518, Diego Velásquez, conquistador de Cuba, enviou expedições para reconhecer as costas da Tierra Firme ao longo do Golfo do México, encontrando indícios de que havia uma rica civilização no interior. Velásquez ordenaria que Hernan Cortés fizesse uma expedição de comércio ao continente, mas, temendo as ambições de Cortés, revogou a ordem. Mesmo assim, Cortés partiu para o interior com uma expedição modesta de 600 homens, 16 cavalos, 14 canhões e 13 mosquetes.

De Cuba, Cortés chegou em Yucatán, onde encontrou Jerónimo de Aguilar, um náufrago que falava maia. Depois encontraria em Tabasco uma mulher chamada Malintzin, que falava nahuatl e maia e que seria intérprete de Cortés. Esses dois seriam essenciais para a campanha de Cortés. Na Sexta-Feira Santa de 1519, Cortés fundaria Veracruz na costa do Golfo do México em uma área sob jurisdição do imperador asteca Montezuma. Alguns dias depois, emissários astecas apareceram com presentes e um amigável pedido para que eles saíssem dali.

Cortés fez o contrário. Mandou todo o ouro que conseguiu reunir para a Espanha, de forma a garantir alguma legitimidade para a sua empreitada, e preparou um ataque contra Tenochtitlán, capital do Império Asteca. No caminho, Cortés descobriria sobre as divisões políticas entre os astecas e seus inimigos externos e planejaria como utilizar isso em seu favor. Em Cempoala, conseguiu o apoio dos Totonacs e dos Tlaxcalans.

Montezuma, por sua vez, combinou diplomacia ritualística com ameaças veladas e ataques surpresas. Não se sabe qual era a sua intenção estratégica ao permitir que os espanhóis entrassem tão profundamente em seu território. Talvez Montezuma tenha entendido errado Cortés, principalmente pela natureza diferente da guerra na América Pré-Hispânica. Guerra geralmente tem como objetivo matar, ocupar e pilhar, mas entre os americanos nativos o objetivo era dominar e submeter, pegando vivos os inimigos para depois sacrificá-los. Mas essa decisão teria consequências negativas para os astecas.

Eventualmente, os espanhóis chegaram na capital do Império Asteca, e se impressionaram com as construções que encontraram e que os levaram a se perguntar se estavam sonhando. Cortés foi convidado a ter uma reunião com Montezuma e, apesar de pensar que poderia ser uma armadilha, ele foi. Mas quem estava preparando uma armadilha era ele.

Cortés e seus homens ficaram semanas hospedados no palácio de Tenochtitlán. Lá pelas tantas, Cortés atacou Montezuma e o fez de refém. Sabendo que seria impossível enfrentar o muito mais numerosos Império Asteca, Cortés queria tentar um golpe de estado. O pretexto era que Montezuma teria ordenado um ataque contra Veracruz.

Tudo ia bem até Veracruz ser atacada, mas não pelos astecas, e sim pelos espanhóis liderados por Pánfilo Narváez com ordens de punir Cortés. Acreditando que só ele poderia lidar com essa situação, Cortés voltou para Veracruz, deixando um de seus comandantes, Pedro de Alvarado, responsável por Montezuma. Alvarado ficou alarmado com os rumores de que os astecas atacariam os espanhóis e ordenou um ataque preventivo contra astecas em reunidos em uma cerimônia religiosa, o que resultou em um massacre que ultrajou os astecas e iniciou uma rebelião.

Cortés lidou admiravelmente com a situação e convenceu os espanhóis que vieram enfrenta-lo a se juntar a ele contra os astecas, mas na volta encontrou uma Tenochtitlán beligerante. Cortés ainda mantinha preso Montezuma, mas não o imperador, cargo que é escolhido por eleição, e não hereditariedade. Montezuma morreria logo após o retorno de Cortés, o que minou a sua estratégia de conquista e tornou uma saída de Tenochtitlán inevitável, o que ocorreria no final de junho de 1520.

Só restou a Cortés um ataque direto contra os astecas. Cortés reuniria reforços entre os espanhóis e os índios, e o maior reforços seria a varíola, trazida de soldados de Narváez e que vitimou o novo imperador, Cuitláhuac, que seria sucedido por Cuauhtémoc, que já não nutria ilusões quanto aos espanhóis.

Em abril de 1521, Cortés reiniciaria a ofensiva contra os astecas. O primeiro ataque frontal foi uma falha, apesar de quase ter tomado o templo central. Cortés mudaria de tática e seria mais gradual, tentando tomar prédio por prédio já que o labirinto da cidade anulava a vantagem do uso de cavalos. Bloquear a linha de suprimentos para a cidade também foi um passo importante para uma guerra desgastante. Em 13 de agosto, os espanhóis capturaram o imperador Cuauhtémoc. Ansioso por poder recompensar seus soldados com tesouros, Cortés torturou Cuauhtémoc e o obrigou a contar onde ele mantinha os tesouros tomados dos espanhóis após a retirada do ano passado.

Com a vitória militar, Cortés passou a reconstruir a cidade e consolidar o domínio espanhol sobre os astecas e teve sucesso em trazer os astecas para o seu lado. Carlos V o recompensaria com propriedades, o direito de receber tributos dos nativos e o título de Marquês do Vale do Oaxaca. Além disso, ele seria o governadora da Nova Espanha, como os territórios seriam chamados por alguns.

Essas vitórias de Cortés suscitaram inveja e suspeita na Espanha. Em 1527, Cortés foi removido do cargo de governador, uma audiência tomou conta do governo e Cortés teve que voltar para a Espanha para se defender. Seu sucessor seria Nuño de Guzman, que recrudesceria o tratamento dispensado aos índios e em 1530 uma nova audiência assumiria para reestabelecer a ordem. Em 1535, seria criado o vice-reinado da Nova Espanha, que seria entregue para Antonio de Mendoza, um reputado administrador do Império Espanhol.


A vitória de Cortés aumentaria as expectativas da Espanha de explorar o Novo Mundo e estimularia outras pessoas a tentarem a sorte e conseguir novas conquistas. Cortés, de volta à Nova Espanha, partiria em novas expedições e chegaria até a Califórnia. Cristóbal de Olid, um dos capitães de Cortés, liderou uma expedição para a conquista de Honduras fazendo um acordo com Diego Velásquez, inimigo de Cortés, que iria atrás de Olid para tirar satisfações, mas Olid morreu antes que Cortés o encontrasse. A expedição acabou sendo inútil, já que nenhum novo reino ou veios de ouro foram encontrados. Pedro de Alvarado passaria dez anos em conquistas na Guatemala e El Salvador, sem encontrar nada próximo do que foi o império asteca. 

domingo, 18 de maio de 2014

Mitologia Iorubá


Sobre a Nigéria, vou falar sobre mitologia ioruba, um dos principais grupos étnicos da Nigéria. Como fonte de informação, o livro African Myths of Origin. Como gameplay, jogos dos sites nigerianos Kuluya e Maliyo.

Os iorubas são um dos maiores grupos etnolinguísticos da África, sendo a etnia majoritária na Nigéria, e se espalhou para além da África através da escravidão. O ponto de origem dos iorubas está na cidade de Ile-ife e a maior parte da história oral e documental estabelece 1500 como o início dos iorubas.

A cultura ioruba nunca foi unitária. Embora haja língua e costumes em comum, os povos eram divididos pela geografia, sistemas políticos e práticas religiosas. Um dos principais fatores de unificação é o sistema de divinação Ifa na qual o babalaô (o divinador Ifa) lê o futuro jogando búzios. Os demais aspectos são bem fragmentados e existem várias histórias sobre um mesmo assunto, nem todas fazendo sentido entre si.

Os iorubas têm muitas divindades, ou orixás, como eles chamam, sendo Olorun, Deus-Céu, o principal deles. Ele é conhecido por vários nomes e atributos, como Eleda, o Criador, Alaye, o dono da vida e Olodumare, o todo poderoso. Aqui, vou chamar todas essas manifestações de Olorun.

Acreditava-se que Olorun tinha uma consorte chamada Ododua, conhecida como Mãe da Cabaça. Isso é o que consta no livro “African Myths of Origin”, mas no “A Dictionary of African Mythology: The Mythmaker as Storyteller”, consta que Ododua era esposa de Obatala, do qual falarei depois. Enfim, os dois (Ododua e Oloru ou Ododua e Obatala) faziam um todo que envolviam o mundo encaixados como uma tigela e a tampa. Mas Ododua não concordava com essa situação, já que, sendo a parte de baixo, ela não enxergava nada. Ododua reclamou, e reclamou tanto que Olorun a cegou arrancando seus olhos. Ela respondeu o amaldiçoando dizendo que ele só comeria lesmas de agora em diante e por isso que lesmas são a oferenda apropriada para Olorun.

Eles tiveram um casal de filhos que tiveram um filho chamado Orugan, que se forçou em sua mãe, que fugiu. Orugan a perseguiu até que ela tropeçasse. No que caiu, se transformou. Seus seios viraram rios e de outras partes de seu corpo surgiram os orixás, como Shango, o orixá do trovão, e suas esposas, Oya, Oshun e Oba que são rios, Olokun, orixá do oceano, Ogun orixá dos ferreiros, caçadores e guerreiros. Isso aconteceu em Ife.

Outra história de origem dos orixás diz que eles derivaram do grande Orixá, que foi morto e seu corpo quebrado em peças por um escravo que ele mantinha como cozinheiro. Muitos fragmentos forma reunidos por Orunmila, orixá de Ifá, e mantidos na cidade de Ifé. Mas ela não conseguiu reunir todos e orixás menores surgiram desses fragmentos.

A próxima história é sobre o mito da criação do mundo. E aqui, de novo, o livro “African Myths of Origin” é um tanto inconsistente. O próprio livro alerta que a história da criação do mundo pode ter tanto Obatala quanto Odoua, como uma forma masculina, podem ser os protagonistas. Mas a parte esquisita começa com a colocação no tempo de “após Olorun criar os orixás”, e não foi bem isso que eu entendi da criação dos orixás. Mas enfim, após Olorun criar os orixás, eles passaram a viver no céu. Abaixo, havia apenas o mar. Após algum tempo, Obatala se cansou de ficar olhando para as águas cinzentas e perguntou a Olorun se era possível criar variedade para o que havia abaixo. Olorun respondeu que, se era esse o seu desejo, que ele o fizesse.

Obatala foi à Orunmila, pedindo que lesse os sinais e contasse o que seria necessário para a tarefa. Orunmila jogou sementes de dendezeiro, ele leu os sinais, cantou os versos e disse que Obatala iria cumprir a tarefa, mas precisaria de alguns itens. Ele precisava de uma cumprida corrente de ouro, uma casca de caracol, uma galinha, semente de dendezeiro e um gato.

Obatala passou algum tempo coletando ouro dos outros orixás e então levou o ouro para o ferreiro, que forjou a corrente com o ouro. Com a corrente, ele desceu o máximo que pôde até as águas. Jogou a casca do caracol na água, onde lá ficou e passou a multiplicar até cobri as águas. Obatala então jogou a galinha, que começou a remexer na areia criando colinas e vales. Depois, desceu até a terra e plantou a semente de dendezeiro, que imediatamente cresceu totalmente. E Obatala viveu debaixo da árvore, que é conhecida como Ifé. E o gato? Vai bem, obrigado por perguntar. Quer dizer, o gato ficou vivendo com Obatala.

Obatala então passou a fazer figuras de argila, depois soprando vida nelas. Essas figuras de tornariam pessoas que povoariam a terra criada por Obatala. Outros orixás desceriam dos céus e se juntariam a ele. Olorun então criou o sol e a lua e deu lua para os dois.

O sol deixou Obatala com sede e ele bebeu da seiva da palmeira. Ele ficou bêbado com a seiva e algumas das figuras que ele criou ficaram deformadas ou incompletas. Ele adormeceu e, quando acordou, viu o que tinha feito e se arrependeu. Prometeu nunca mais beber da seiva e se tornou protetor das crianças de sua bebedeira.

Uma versão alternativa para a criação do mundo com Obatala, contada no livro “A Dictionary of African Mythology: The Mythmaker as Storyteller” era a de que ele foi convocado a criar o mundo por Olodumare, a manifestação de criador do Deus Supremo da Mitologia Yorubá. Ele teria levado uma galinha de cinco dedos, um pombo e uma cabaça com terra. Ele jogou a terra e depois soltou o pombo e a galinha, que espalhariam a terra. Obatala então retornaria para Olodumare para anunciar o seu sucesso. Olodumare mandaria um camaleão para examinar a situação e receberia a confirmação da criação do mundo. A próxima tarefa seria a criação do homem. Aqui, o mito é parecido com a versão anterior, com o acréscimo de que o trapaceiro Esu teria embebedado Obatala por inveja de seu sucesso. Olodumare via que Obatala não estava fazendo seu trabalho e mandou Odoua (na forma masculina) para terminar o trabalho. Odoua criaria a sua própria raça de homens, povoaria o mundo e colocaria os homens sob sua liderança. Obatala acordou, viu que foi substituído e começou um conflito com Odoua.

Há outra versão da criação do mundo, a de que Odoua criou o mundo. O começo é o mesmo, com os orixás vivendo no céu com apenas mar abaixo deles. Os orixás queriam criar alguma coisa e consultaram Orunmila após permissão de Orolun. Orunmila sugeriu que os orixás enchessem de areia a casca de um caracol e que encontrassem cinco galinhas com cinco dedos. Obatala e Odoua foram escolhidos para criar o mundo e partiram para encontrar um caminho para descer dos céus. No caminho, eles encontraram uma árvore de palmeira. Obatala bebeu da seiva, se embebedou e adormeceu.

Odoua invejava Obatala pelo seu papel primordial no processo de criação. Enquanto Obatala dormia, Ondua pegou os itens necessários e prosseguiu por conta própria. Chegando perto das águas, jogou a areia e depois soltou as galinhas. A areia se espalhou e cobriu as águas e as galinhas ficaram sob a areia, ciscaram e criaram colinas. O local central onde Ondua e as galinhas primeiro vieram à terra é a árvore Ife e Ondua se proclamou rei desta terra. E é porque Ondua usurpou o papel de Obatala que o mundo conheceu guerras e outras catástrofes.

No livro “A Dictionary of African Mythology: The Mythmaker as Storyteller”, outra história de criação. A terra e o céu costumavam ser mais próximos, mas os humanos irritaram Orolun ao usar o céu como comida e limpar suas mãos nele. Orolun então separou mais céu e terra e governaria o mundo à distância. Para criar a terra sólida, Orolun convocaria Obatala para fazer o serviço. Ele deu terra em uma casca de caracol e uma galinha e pombo. O resto segue igual à outra história de Obatala, com o acréscimo de que, depois de criar a terra, Obatala levaria Orunmila para equipá-la. Orunmila deu a árvore de palmeira que serviria de alimento, bebida, óleo e abrigo. Daria outras árvores que serviriam de bebida, já que não existia chuva. Já havia humanos, mas não em grande número, então Obatala criava um molde sem vida e Orolun sopraria vida neles.

Origem da adivinhação ifá
Para terminar, duas origens para a adivinhação ifá, que inclui jogar búzios. No começo, havia poucos humanos fazendo sacrifícios para os orixás, o que os deixavam com fome. Ifá então partiria para procurar comida e encontrou Exú, que contaria que se tivesse dezesseis sementes de dendezeiro poderia mostrar a Ifa como ler o futuro. Ifá pediria para Orungan, o primeiro humano, e sua esposa, Orishabi, pelas sementes e eles concederiam à Ifá.


Em outra história, o homem que descobriria a adivinhação é um homem chamado Setilu, que nasceu cego. Com o tempo, ele foi mostrando uma enorme capacidade de adivinhação sobre quem iria visitar a família e depois para eventos maiores. Ele usava dezesseis seixos em sua adivinhação. Ele teria sido expulso pelos muçulmanos e ido para a cidade de Ifé, onde congregaria seguidores, para os quais ensinaria as suas práticas. Com o tempo, passaria a usar sementes de dendezeiro no lugar de seixos.

sábado, 17 de maio de 2014

Conquista Espanhola (#2): Descoberta


Aqui eu vou começar uma parte longa da série falando sobre América Latina. Infelizmente, não tenho tanto como individualizar os países, então serão seis vídeos genéricos sobre América Latina para os seis países da América do Sul e Central que estão na Copa, fora Costa Rica que já falei e o Brasil. A fonte de informação é o livro The Penguin History of Latin America. A gameplay é do jogo Expeditions: Conquistador, que fala sobre a conquista de Hispaniola, mas enquanto eu escrevia os textos senti que tinha tudo a ver com o jogo, apesar dos eventos não serem os mesmos.

O desejo de viagens ultra marítimas veio da necessidade de estabelecer o comércio com o extremo oriente, chamado genericamente de Índias, onde era possível encontrar bens muito procurados por europeus, como temperos e seda. As histórias fantásticas de Marco Polo sobre o oriente ajudaram a aumentar o fascínio. Esse comércio existia, mas era demorado, dependia de intermediários em Veneza e Genova, que prosperaram nessa época, e depois essa rota seria bloqueada pelo Império Otomano.

Outro problema que inspirou as viagens foi a busca por ouro, que eram usados para pagar pelas especiarias e que provinham principalmente da África. Porém, o comércio na África era lento demais, dependendo de viagens de camelo, o que diminuiu o fluxo de ouro para a Europa, que já não podia pagar pelas especiarias orientais. Desastres como a Peste Negra piorariam ainda mais a situação europeia.

Portugal e Espanha, dois dos países mais afetados, começaram a procurar alternativas para o comércio de ouro, escravos e especiarias. Em 1415, Portugal cruzaria o Estreito de Gibraltar, conquistaria Ceuta e estabeleceria uma rota marítima até a África subsaariana. Depois, explorariam as Ilhas Açores, Madeira e Canarias, onde estabeleceriam plantações de cana de açúcar. Após cruzar o Cabo Bojador em 1434, estabeleceriam uma rota direta de comércio de ouro com o Sudão.

Ao longo da África Ocidental, Portugal foi criando feitorias, que são entrepostos comerciais, em pontos estratégicos. Por fim, Bartolomeu Dias cruzaria o Cabo da Boa Esperança em 1497 e abriria caminho para a expedição de Vasco da Gama ao Oriente em 1498, criando uma rota de comércio com a Índia, e tornando Portugal o principal intermediário europeu com o oriente, além do comércio de ouro, escravos e de açúcar.

Cristóvão Colombo tinha uma ideia melhor do que circundar a África. Eles poderiam viajar para oeste e chegar à Ásia cruzando o Atlântico. Seria uma ótima oportunidade comercial, além de trazer fama para quem conseguir efetuar tal empreitada, apesar dos riscos, já que ninguém sabia a extensão do Atlântico. Além do mais, era uma oportunidade de espalhar a fé cristã e assim enfrentar os muçulmanos. Colombo calculou errado a distância da Europa até a Ásia. Ele esperava encontrar terras não descobertas ao longo do caminho, mas não esperava o que iria encontrar além do Atlântico.

Tudo ia bem, mas era necessário financiamento e apoio político. O rei de Portugal, João II, não se animou muito com o projeto de Colombo, o considerando arriscado, tendo em vista a base científica frágil dele, e uma diversão de recursos de projetos mais certos como o africano. Colombo então foi para a Espanha conseguir apoio financeiro, e o obteria em 1492. Após a expulsão dos muçulmanos de Grana, Fernando II de Aragão e Isabel I de Castela aceitariam apoiar Colombo e foram extremamente generosos, garantindo os títulos de Almirante do Mar, Vice-rei das Índias e governador de todas as terras que ele encontrasse em suas viagens, além de 10% das riquezas que descobrisse. Se Colombo tivesse sucesso, Aragão e Castela conseguiriam superar Portugal na corrida das especiarias.

Em 3 de agosto de 1492, Colombo partiu em três naus: a galícia Santa Maria de 100 toneladas e duas naus espanholas em estilo português, Pinta e Niña, com 60 e 50 toneladas respectivamente e contaram no total com 87 tripulantes. A frota teve que fazer uma pausa nas Canárias, e seguiria viagem oceânica em 9 de setembro. Após um mês no mar, Colombo começou a ver sinais auspiciosos, como pássaros e uma estranha luz brilhando no horizonte. Em 12 de outubro, foi avistada terra de madrugada. Horas depois, eles desembarcariam no que ele chamaria de San Salvador, atual Bahamas.

Os nativos foram recepcionar os estranhos convidados e foi um baita choque cultural. Os nativos estavam nus com pintura corporal e não eram hostis, mas não eram o que Colombo estava buscando. Estava claro para ele que não tinha chegado ao Japão, como esperava. San Salvador não era exatamente o que ele estava esperando e logo Colombo prosseguiu viagem. Encontrou uma ilha maior (Cuba), onde esperava encontrar o Japão e ouro. Ele não encontrou nenhum dos dois, mas encontrou tabaco, que no futuro seria explorado pelos espanhóis.

Então, foi para outra ilha que lembraria a Espanha e que ele chamaria de Hispaniola, área que inclui atualmente o Haiti e a República Dominicana.  Lá, os nativos usavam ornamentos de ouro e ele encontrou um chefe, Guacanagari, que mostrava algum atributo de realeza e pareceria a ele que estava chegando perto da China e do Japão. Ele falaria de um lugar chamado Cibao, que ele pensou que poderia ser Cingapu, o nome pelo qual ele conhecia o Japão.

No natal de 1492, a Santa Maria bateu em um recife de corais e teve que ser abandonada. De seus destroços, foi criada a primeira colônia espanhola chamada de Navidad com a ajuda dos homens de Guacanagari e Colombo retornou para a Espanha na nau Niña, deixando 21 voluntários para trás.

Em 20 de abril de 1493, Colombo chegou à Espanha e se apresentou ao rei Fernando e à rainha Isabel, mostrando seis nativos das terras que visitara, confiante de que chegou nas Índias. Essa era a chance para os espanhóis chegarem nas Índias antes do que os portugueses, que ainda não tinham chego. O papa Alexandre VI emitiria uma série de bulas garantindo a posse das terras no continente ao oeste para a Espanha e depois haveria um acordo no Tratado de Tordesilhas em 1494 separando o oeste entre as duas potências ibéricas, tudo além de 370 léguas de  Açores e Cabo Verde ficando para a Espanha.

Antes mesmo do Tratado, Colombo partiu em uma segunda missão em 25 de setembro de 1493, com dezessete navios e 1500 homens com a intenção de fundar uma colônia na área que descobriu. Chegando em Hispaniola, descobriu que os nativos destruíram Navidad por conta do comportamento dos colonos. Os colonos agiram com violência contra os nativos e procuraram utilizá-los como força de trabalho escrava, e foram reprimidos com violência, para a derrota dos espanhóis. Colombo foi mais para leste e fundaria uma nova colônia chamada Isabella, em homenagem à rainha. Depois, iria atrás de Cibao.

Quando retornou, viu mais amostras de indisciplina entre os colonos. Houve uma briga entre catalães e seu irmão, Diego, deixado encarregado da colônia enquanto ele estava fora. Tentou satisfazer a todos autorizando expedições mais brutais em busca de ouro, para satisfazer aqueles mais sedentos por ganhos rápidos, e fez um repartimiento de índios cativos para trabalhar para os espanhóis. Os nativos se revoltaram, mas foram derrotados pelas armas dos espanhóis.

Em 1496, Colombo voltaria para a Espanha para se defender de calúnias de ex-colonos e defender o seu empreendimento, que já começava a ser visto com descrédito, sem sinal de ouro ou de um caminho para o Oriente. Além do mais, Isabel estava incomodada com o tratamento dos índios, que ela tinha proibido expressamente de serem usados como escravos. Apesar disso, os monarcas mantiveram o apoio à Colombo, até por saberem que Portugal preparava uma expedição à Ásia via África.

18 meses depois, Colombo montaria uma nova expedição, agora financiada pelo tesouro e supervisionada pelo arquidiácono de Sevilha, Juan Rodrigues de Fonseca. Ele partiu em maio de 1498, chegaria em Trinidad em julho e seguiria viagem até chegar à Venezuela. Colombo estava obcecado demais para perceber as implicações de sua descoberta, e só Amerigo Vespúcio depois formularia a ideia de que se tratava de um continente separado da Ásia e foi o primeiro a chamar essa porção de terra de “Novo Mundo”. Colombo, por sua vez, pensava que o delta do Orinoco era um rio que, de acordo com as escrituras, irrigava o Paraíso.

Chegando em Hispaniola, Colombo encontraria uma situação de guerra civil. Santo Domingos, estabelecida pelo irmão de Colombo, Bartolomeu, estava pior do que o assentamento de Isabela. Ele tentou apaziguar, mas era visto como um estrangeiro e perdeu ainda mais de sua autoridade. As notícias chegaram na Espanha e em agosto de 1500, um oficial espanhol, Francisco de Bobadilla, chegou com ordens de investigar os problemas, prendendo os irmãos de Colombo e o mandando de volta para a Espanha acorrentados.

Colombo não conseguiu transformar Hispaniola em uma feitoria e ouro só poderia ser obtido através de escavação de minas, o que exigia uma operação mais complexa. Assim, a coroa cassou o monopólio de Colombo da exploração do Novo Mundo e mandaria em fevereiro de 1502 Nicolás de Ovando para ser o primeiro governador do que seria a América Espanhola.


Colombo ainda queria encontrar um caminho para as Índias e conseguiu financiamento para uma quarta viagem, partindo em maio de 1502. Ele não encontrou o Oriente nos dois anos de viagem, mas explorou a América Central passando por Honduras, Nicarágua, Costa Rica e Panamá. De volta à Espanha, tentou restaurar seus privilégios, mas só conseguiu com que seu filho, Diego, fosse eleito governador de Hispaniola e retivesse os títulos hereditários de vice-rei e almirante. Colombo morreria em 1506, convencido de que tinha chego à Ásia.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Conquista Espanhola (#1): Istmo Centro-Americano


Nesse vídeo, vou falar sobre América Latina, mais especificamente América Central, mas não vou usar o livro que eu vou utilizar mais na parte de América Latina, e sim o Central America: A Nation Divided de Ralph Lee Woodward Jr., que é focado na história da América Central. O objetivo do livro era falar sobre o potencial de uma união no Istmo Centro-Americano. Um istmo é uma faixa de terra que liga duas grandes extensões de terra, nesse caso, América do Norte e América do Sul. Apesar da colonização em comum, o Istmo Centro-Americano nunca chegou a ser uma nação, por motivos explicados ao longo do livro. A gameplay será do jogo Expeditions: Conquistador.

Nesse vídeo, falarei sobre o primeiro capítulo do livro, descrevendo o Istmo. A América Central sempre foi descrita como um paraíso e, apesar das terras férteis, isso está longe de verdadeiro e até hoje é uma região subdesenvolvida.

A geografia ajuda a explicar os problemas da região, cortada por cadeias de montanhas vulcânicas. Essas montanhas dificultam a comunicação e a agricultura, mas serviram também de abrigo para índios contra os europeus. A América Central não tem nenhum grande rio navegável e as costas não oferecem bons portos naturais. A costa do Caribe oferece portos naturais melhores, mas o calor, o terreno e as doenças atrasaram o seu desenvolvimento. Grande parte da população vive em regiões com altitude mais elevada, que podem chegar a 4.100 metros, principalmente no começo da colonização europeia, embora hoje em dia haja áreas densamente populadas ao nível do mar, como o Panamá. Áreas mais altas também tinham os seus problemas apesar do clima temperado e condições mais salubres, como doenças, períodos de seca e dificuldades na rede de transportes.

E toda a América Central está sujeita a desastres climáticos, como furacões, terremotos e erupções vulcânicas, afetando de modo diferente as diferentes partes do continente. Esses desastres afetam a mentalidade da população, que vê a morte e a tragédia como muito próximas deles e adota até uma postura de estoicismo diante disso.

Além disso, fatores humanos afetaram a colonização da América Espanhola. E apesar de formarem um só reino, a verdade é que cada província teve um desenvolvimento próprio, com suas lealdades e interesses se desenvolvendo em separado, o que foi agravado por obstáculos geográficos. Apesar do potencial de união do qual o livro fala, a verdade é que nem a América Central muito menos a América do Sul formaram uma única nação e até competiam e guerreavam entre si antes e depois da conquista espanhola.

Antes da colonização, abrigava uma série de povos, como os maias, que ocupavam territórios em Chiapas, Yucatán, Guatemala, El Salvador e Honduras. Os próprios maias eram desunidos, não havendo um grande estado unificado, diferente do que ocorria com os incas e astecas, havendo sim uma série de cidades-estado unidas pela mesma cultura e que comercializam bastante entre si. Eram unidos por traços como arquitetura, artes, cerâmica e escrita, com variações de ênfase e talento.

Há sinais de civilização na América Central que começam em 2130 antes de cristo. Havia um comércio, principalmente de alimentos, e influências culturais mútuas na América Central. A civilização maia começou a se desenvolver no início da era cristã nas terras baixas de Petén, provavelmente com migrações das terras altas que já estavam com excesso de população, havendo um comércio entre terras baixas e altas.

Os maias receberiam influências culturais de outras civilizações, como os olmecas, os astecas e os pipiles. Houve no primeiro milênio uma série de migrações dentro da América Central, o que resultou em influência mútua das diversas civilizações que ocuparam a região, o que se manifesta no estilo das esculturas e da cerâmica.

A civilização maia era bem avançada, com descobertas matemáticas e astronômicas comparáveis às do Egito antigo, com os quais desenvolveram calendários (que depois, causariam confusões em nossa era) e um complexo sistema de administração. Desenvolveram também um sofisticado sistema de hieróglifos e sua cerâmica, tecelagem e pinturas demonstravam grande sensibilidade estética. Os maias não tinham iguais na América Pré-Colombiana que rivalizavam com os europeus. Tecnologicamente, no entanto, estavam atrás dos europeus, a arquitetura não sendo mais avançado do que a dos gregos-romanos, e eles não desenvolveram maquinas economizadoras de energia, não utilizaram bem a roda e como não tinham muitos animais domesticáveis dependeram muito do trabalho humano.

O período clássico foi de 300 e 900 depois de Cristo e uma nova civilização Maia surgiu em Chiapas e Yucatán. Os principais monumentos maias que existem até hoje são do período pós-clássico. O avanço artístico e científico continuaram, mas era menos impressionante do que no período clássico. Guerras internas e invasões de outros povos minaram os maias e quando os espanhóis chegaram eles já estavam em declínio, embora tenham resistido mais tempo do que os astecas e os incas. A região do período clássico teve um renascimento com migrações para as terras baixas como refúgio dos problemas que afligiam os maias nas demais regiões.

Nas terras altas no começo do século 12, vários tribos começaram a crescer de poder, como os Quiché, os Cakchiquel e os Zutugil, havendo uma intensa rivalidade entre os três. Os Quiché eram mais fortes, mas os Cakchiquel venceram os Zutugil e se tornaram maiores. No conflito entre as duas tribos que restaram, os Cakchiquel sofreram com pragas e um incêndio na capital. A chegada dos espanhóis suspendeu o conflito, mas os dois lados sofreram com a varíola, piorando a situação relativa dos Cakchiquel. Os Quiché aproveitaram a situação para retomar o conflito. Com os aliados astecas dominados, os Cakchiquel pediram ajuda aos espanhóis, que assim o fizeram e acabaram por dominar os dois lados.

As ruínas da civilização maia que chegaram aos dias de hoje em áreas que vão de Honduras até Yucatán são impressionantes, mas o aspecto principal que perdura é o modo de vida. A principal atividade das populações pré-columbianas era assim como ainda é a agricultura, com gêneros como milho, feijão, frutas, vegetais e algodão. Boa parte da população vive hoje como antes, com casas de palha com paredes de pedra, madeira ou palha de milho.

Os homens trabalhavam nas colheitas e as mulheres cuidavam da casa e fabricam utensílios domésticos e roupas. Cada vila se especializava em determinadas atividades, alguns se especializando em algodão, outros em joias e cestaria e por ai vai, comercializando os seus bens com outras vilas. Não há evidência de que os nativos usavam moedas, mas eles faziam trocas por bens e usavam pedras semipreciosas e sementes de cacau como moedas de troca.

A educação maia consistia em aprender os trabalhos e práticas dos pais e apenas as crianças dos sacerdotes e da classe governante recebiam educação formal, onde aprendiam a ler e a escrever e ciências, de forma parecida que era na Europa. Sociedades agrícolas não costumam ser lembradas pela recreação e pela arte, mas os maias eram. Eles jogavam vários tipos de jogos de bola, inclusive com os pés, que diziam ser um ancestral do futebol. Tocavam vários instrumentos de sopro e percussão. A pintura também era uma atividade comum e eles inclusive pintavam suas cerâmicas com motivos religiosos.

A religião era muito importante para os maias e os sacerdotes eram os membros mais poderosos da sociedade, que era praticamente teocrática, na medida em que os sacerdotes aconselhavam e dirigiam os governadores civis. Sacrifícios humanos eram praticados em algumas, mas não em todas as regiões. Havia toda uma teologia complexa, mas o povo preferia seguir crenças mais simples em torno de conflitos do bem contra o mal. Com a conquista espanhola, as crenças antigas se misturaram com o cristianismo, a mitologia maia e o cristianismo tendo vários pontos em comum, como ocorre com a maior parte dos sistemas de crenças.

 Havia um foco no conflito entre o bem e o mal e os diversos deuses da mitologia nativa podiam ser associados com os santos cristãos. Além disso, a cruz era símbolo do deus da chuva para os maias. Isso facilitou a conversão dos índios ao catolicismo, assim como ocorreu em outras áreas durante a Conquista e mesmo hoje o cristão da América Central age de uma forma bem diferente do que na Europa.

Até hoje, os maias são mais centrado na própria família ou comunidade, não tanto para a nação. De fora, suas características principais parecem ser paciência, cautela, estoicismo e reserva, refletindo séculos de opressão, mas dentro de um núcleo mais familiar demonstram uma gama maior de emoções. Cada vila se vê como uma unidade completa, o que acabou por criar barreiras culturais com outras vilas ou mesmo com povos modernos. Remanescentes de povos não-maia ainda existem, mas em menor número e menor influência.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Dia dos Mortos Mexicano


Sobre o México, falarei sobre o Dia dos Mortos, uma série de festividades que ocorrem entre os dias 31 de outubro e 2 de novembro. Utilizarei como fonte de informação o livro Day of the Dead de Kitty Williams e Stevie Mack, um livro curtinho, mas com bastante informações. A gameplay será do jogo Grim Fandango, que é baseado no Dia dos Mortos Mexicano.

A introdução do livro conta com uma citação do livro “Labirinto da Solidão” do escritor mexicano Octávio Paz, que mostra as diferenças de percepção da morte entre os mexicanos e outras culturas. Enquanto que em outros lugares a palavra nunca é pronunciada porque queima os lábios, nas palavras de Paz, os mexicanos zombam, acariciam, dormem com ela, a entretém.

O Dia dos Mortos é uma das principais festas populares no México, parecido com o Halloween, até por caírem em datas próximas, mas com algumas diferenças. O Dia dos Mortos é uma ocasião mais familiar do que o Haloween, com as famílias se reunindo nessa época do ano. Me pareceu uma mistura de Halloween com Dia de Ação de Graças e Carnaval, por mais estranha que essa combinação possa parecer.

O Dia dos Mortos têm raízes tanto em tradições europeias quanto do Novo Mundo pré-hispânico. Como em outras culturas, os povos nativos misturavam o culto aos mortos com festividades da colheita e várias imagens encontradas em sítios arqueológicos mostram essa dualidade vida-morte. A ideia é a de que a vida nasce da morte. Na mitologia asteca, o quinto mundo começou quando Quezacolt (sim, a GF do Final Fantasy VIII) derramou sangue nos ossos de seu ancestral, Mictlán, e criou a raça humana. Essa crença infelizmente incluía sacrifícios humanos como oferenda aos deuses para uma boa colheita. Assim como o preço da vida era a morte, o preço da morte era a vida.

Os astecas temiam mais as incertezas da vida do que a morte. A morte era vista como uma libertação dos fardos terrenos e era determinada não pela maneira como se vivia, mas como se morreu. A crença asteca era que o além tinha treze níveis de céus e nove de inferno e o destino era determinado pela forma como se morria, guerreiros caídos em batalha e mulheres dando a luz indo para os níveis superiores. Acreditava-se que a viagem para o mundo dos mortos durava quatro anos de grandes perigos para superar, por isso que rituais eram executados nos quatro anos seguintes à morte de uma pessoa.

Anualmente, os astecas participavam de festivais dedicados aos mortos, com elementos em comum com o Dia dos Mortos, como flores, comida e dança. Acreditava-se que os mortos voltavam para a casa onde residiram, e para recebê-los, os astecas ofereciam uma variedade de comidas aos mortos. Os residentes mantinham vigília durante a noite e não ousavam levantar os olhos, temendo serem punidos pelas almas por sua falta de respeito.

Com a chegada dos espanhóis, incorporaram elementos cristãos aos rituais. É uma mistura das tradições nativas com o Dia de Todos os Santos e o Dia de Finados. Os espanhóis foram ao “Novo Mundo” não apenas para conquistar territórios e pilhar ouro, mas também, como objetivo secundário, catequizar os nativos. O conquistador Hernán Cortés se aproximou do líder asteca Montezuma II na tentativa de converter o governante ao cristianismo. Um fato auxiliou os espanhóis: a imagem de Quezacolt era geralmente associada com uma serpente alada, mas também como um homem barbudo de pele branca, que velejou pelo Golfo do México prometendo retornar. Os frades descobriram crenças e rituais parecidos entre as duas culturas e usaram essa similaridade para facilitar a conversão. Deuses pagãos acabaram se misturando com santos católicos e eventualmente substituídos. Quezacolt virou São Tomás, por exemplo.

Outras culturas também celebravam cultos parecidos mais ou menos na mesma época do ano, que fica entre o equinócio do inverno e o solstício de verão, considerada uma época poderosa de magia e comunhão com os espíritos. O véu entre os mundos dos mortos e dos vivos era considerado mais fraco nessa época, o que possibilitaria a vinda dos mortos.

A crença mais comum é a de que as almas das crianças (los angelitos) retornam para a terra primeiro, seguidas pelas almas dos adultos. Em alguns lugares, outros dias são reservados para determinadas categorias de mortos, como aqueles que não deixaram herdeiros e os que morreram de maneiras violentas. A participação das festividades, especialmente entre os nativos, é reforçada pela crendice de que pessoas adoecem ou morrem por não participarem do Dia dos Mortos e não terem cumprido suas obrigações com os mortos.

Nos dias anteriores ao Dia dos Mortos, o movimento é intenso no comércio. São vendidos doces em formas de caixões e crânios, com nomes escritos nas testas. Jovens e adultos compram esses doces para presentear amigos e namorados ou namoradas, significando uma amizade ou amor duradouros que continuam após a morte até a próxima vida. Velas de tudo quanto é tamanho e formatos também são muito vendidas, assim como incenso, principalmente de copaíba. Flores são vendidas como em nenhuma outra época do ano e os mercados se enchem de pessoas para comprar os últimos preparativos para um grande jantar – frango ou peru, chile, chocolate, enchiladas etc. Também há muitos trabalhos artísticos, como crânios sorridentes e esqueletos dançantes.

O Dia dos Mortos é uma ocasião alegre, diferente do nosso Dia de Finados, uma celebração de boas-vindas aos espíritos dos mortos que voltam por um período de 24 horas para aproveitar os prazeres que tiveram em vida, o que inclui boa comida. As almas que retornam não são temidas, e sim bem-recebidas. É um misto de reverência aos mortos com folia para fazê-los feliz, com um toque de zombaria da morte.

Os membros da família falecidos são recebidos com comida e bebida em um altar (ofrenda). A ofrenda é um dos principais elementos do Dia dos Mortos, geralmente uma mesa colocada próxima à parede, podendo haver vários níveis como pirâmides do período pré-hispânico. A forma varia bastante, mas há os quatro elementos nas ofrendas. Os vivos colocam água, porque os espíritos devem estar com sede depois da longa viagem. Fogo é representado por velas, uma para cada espírito sendo honrado. Frutas e vegetais representam a terra. E o papel picado, parecido com bandeiras de São João, com crânios ou esqueletos ”picados” na bandeira, representa o vento.

O papel picado é uma tradição das festividades mexicanas e as cores variam de ocasião. Para o Dia dos Mortos, geralmente se usa laranja, roxo e rosa. Um pouco de sal em um prato purifica o ar. Além de comidas, os vivos atraem os mortos com flores, principalmente a malmequer (cempasúchil) com seu aroma forte, que são colocadas nos altares ou nos túmulos. Fotografias e bens pessoais dos falecidos, imagens religiosas e crânios (com nome de falecidos na testa) ou esqueletos de açúcar ou de chocolate e velas completam as ofrenda. Relevos em areia à frente das ofrendas também são feitos em algumas regiões, como Oaxaca. Pétalas de flores levando à porta de saída são usadas para guiar os espíritos.

Há a possibilidade de altares coletivo, por assim dizer, em praças ou igrejas para aqueles que não tem quem os honre ou para problemas específicos como AIDS e drogas. Outra decoração coletiva são relevos de areia nas praças (zócalo) em áreas geralmente de 12 por 15 pés onde diversas pessoas trabalham em temas de Dia dos Mortos.

O aspecto artístico é levado muito em conta pelos mexicanos na hora de preparar as ofrendas. Um aspecto interessante de vários dos elementos das festividades de Dia Dos Mortos é o caráter efêmero (doces de açúcar, areia, pétalas de flores etc.), a pretensão sendo que durem apenas até o final desse período mostrando a fragilidade e impermanência da vida.

Outra tradição do dia dos mortos é o pan de muertos, pão dos mortos, usado para decorar as ofrendas e que tem sabor de laranja ou anis feito em formato de crânios, ossos ou esqueletos. Geralmente, tem formato redondo, representando o ciclo da vida.

Na parte da decoração das casas e ruas, muitos crânios e esqueletos (chamados de calacas), mas não em uma forma assustadora ou bruta, e sim com aparência risonha e cheia de cores. Esses esqueletos estão trajados como pessoas comuns e há muitos noivos também, simbolizando um amor que vai além da vida. São feitos de papel, madeira, papel marchê, barro, de tudo quanto é maneira limitado apenas pela criatividade dos artistas. Uma variação especial desses bonecos é o mono de calendas, marionetes gigantes de papel marchê com 15 pés (4,5 metros mais ou menos) que lembram um boneco de Olinda. Monos de calendas possuem formas humanas, não de esqueletos ou mortos. Uma pessoa entra dentro desse boneco e dança ao som da banda.

Após a recepção dos mortos em casa, os vivos seguem em vigília aos túmulos, podendo haver noites especiais para alguns tipos de mortos, como crianças ou aqueles que tiveram uma morte violenta. Os cemitérios se enchem de velas e incensos de malmequer e copaíba. Como a maioria dos cemitérios não tem uma boa manutenção, os familiares aproveitam para cuidar dos túmulos de seus familiares. Como no resto do Dia dos Mortos, a vigília dos túmulos também é festiva, com música, muita conversa, inclusive sobre os mortos, fogos de artifício e muita comida, até compartilhada entre familiares, amigos e até desconhecidos. Essa é uma hora de aproveitar a companhia dos mortos, mas também de socializar com os vivos.

Em algumas áreas, especialmente Oaxaca, há os chamados comparsas, pessoas fantasiadas e mascaradas que dançam pelas ruas e encorajam o retorno de almas que podem estar ainda vagando. Eles são acompanhados por uma banda e menestréis.

O ilustrador mexicano José Guadalupe Posada, que viveu entre 1852 e 1913, tem vários trabalhos com o tema do Dia dos Mortos. Costumava fazer ilustrações de políticos e ricos como esqueletos, lembrando que a morte iguala tudo, como na expressão latina. Posada viveu na mesma época que o ditador Porfírio Diaz e, por conta de sua atividade política, viveu na pobreza e era periodicamente preso. Uma de suas mais famosas imagens é de Catrina, uma mulher-esqueleto bem vestida com um chapelão, que se tornou uma figura bem popular no Dia dos Mortos. Em espanhol, catrín é um dândi e Catrina seria o equivalente feminino.

No final do livro, os autores dão receitas de como preparar os vários elementos da celebração do Dia dos Mortos, da ofrenda ao pan de muerto.


Em suma, o Dia dos Mortos é uma ocasião festiva que tem os mortos como convidados de honra. É um convite para aceitar a morte e zombá-la.