Sobre a
Alemanha, eu vou falar da Guerra dos Trinta Anos, que acabou envolvendo a
Guerra dos Oitenta Anos e as duas terminariam juntas. Nesse vídeo, vou falar um
panorama bem geral sobre o conflito e poderei entrar em maiores detalhes em
outros vídeos. A fonte de informação é o livro The
Thirty Years War: A Documentary History de Tryntje Helfferich e a gameplay
do Europa Universalis IV.
A Guerra dos
Trinta Anos, ocorrida entre 1618 e 1648, foi um dos mais complexos conflitos
ocorridos na Europa antes do século XX. Envolve elementos religiosos com o
conflito de católicos do Sacro Império Romano e os protestantes e também elementos
políticos, com os habsburgos do Sacro Império Romano buscando a hegemonia na
Europa e recebendo oposição de países como a Suécia e a França, que era
católica, inclusive.
A Guerra
começou com a defenestração de Praga em 1618 e continuou de maneira descontínua
pelos próximos trinta anos, eles não ficaram se matando continuamente por
trinta anos seguidos. Basicamente, são duas fases, antes e depois de 1631. Esse
ano é importante por marcar a vitória da Suécia liderada por Gustavo Adolfo na
batalha de Breitenfeld, o que abriu caminho para uma invasão maior da Alemanha,
a Bavária e Munique sendo ocupadas no ano seguinte. Além disso, Suécia e França
fizeram um acordo nesse ano e a partir de então o conflito já era
definitivamente um conflito europeu, e não apenas alemão.
O principal
teatro da Guerra dos Trinta Anos era a Alemanha. O Sacro Império Romano era um
estado multiétnico, multilinguístico e multireligioso que abrange os
territórios atuais da Alemanha, Holanda, Bélgica, Luxemburgo, França oriental,
Suíça, norte da Itália, Áustria, Eslovênia, Hungria, República Tcheca e Polônia
ocidental. Era uma frouxa república federal e uma monarquia eletiva que foi
dominada por uma família, os habsburgos, de forma que eles quase consideravam a
monarquia como hereditária.
A estrutura
política do Império era hierárquica e regional e, apesar de funcionar bem por
muito tempo, acabou contribuindo para as tensões que levariam até a guerra.
Segundo a Bula de Ouro de 1356, o Imperador era eleito por sete príncipes do
Império. Três desses príncipes eram eclesiásticos, sendo eles os arcebispos de
Mainz, Colônia e Trier. Quatro eram príncipes seculares, o rei da Boêmia, o
duque da Saxônia, o marquês de Brandeburgo e o conde Palatino do Reno. Havia
ainda outros príncipes menores, que governavam territórios de tamanhos variados
e respondiam ao imperador. Eles tinham um assento na legislatura imperial, a
dieta, e pertenciam a um dos dez círculos, ou regiões, que tinham suas próprias
defesas e cuidavam da defesa e taxação na região. A dieta imperial tinha três
colegiados, um dos príncipes votantes, outro dos demais príncipes e outro das
cidades imperiais livres.
Dentro de
cada território, havia uma série de pessoas subordinadas ao príncipe da região
e não diretamente ao imperador. Esses territórios também tinham suas próprias
dietas, dividas em três para clérigo, nobres e burguesia. A maioria dos principados
era hereditária, com a notável exceção do reino da Boêmia.
Uma das
insatisfações políticas da época era o desejo dos governos locais de ter maior
liberdade em relação aos príncipes e estes em relação ao imperador. Os direitos
tradicionais dos príncipes eram chamados de liberdades germânicas e se tornou
grito de ordem de todos aqueles que se opunham ao imperador. Príncipes
estrangeiros também usariam o mote de que a liberdade germânica sofria em todos
os locais e precisava ser preservada. O imperador, por sua vez, via
insubordinação por parte dos príncipes.
A Guerra dos
Trinta Anos foi multifacetada e é composta por uma série de conflitos menores e
mais localizados, como a rivalidade entre Bourbons franceses e os habusburgos,
entre Suécia e Polônia e revoltas em diversas localidades do Sacro Império
incluindo os Países Baixos. No final, juntar todos esses conflitos é uma
maneira didática de compreender essa série de guerras e disputas.
A origem da
Guerra dos Trinta Anos remonta a Paz de Augsburg, assinada em 1555. Antes desse
período, vários príncipes germânicos se converteram ao luteranismo e passaram a
reformar as práticas religiosas em suas regiões, causando uma série de
conflitos dentro e fora desses territórios. Desgastado por essas disputas, o
Imperador Carlos V aceitaria ceder aos príncipes luteranos. O acordo
estabeleceu que os príncipes germânicos poderiam escolher entre o luteranismo
ou o catolicismo, teriam tratamento justo nas cortes e poderiam reformar seus
domínios como quisesse. As propriedades eclesiásticas confiscadas permaneceriam
com os protestantes, mas nenhum confisco adicional poderia ser feito. As
pessoas não tinham liberdade religiosa, mas podiam emigrar. Isso paralisou os
conflitos religiosos no Sacro Império Romano e preveniu uma guerra civil mais
aguda.
Essa solução
não era isenta de problemas, como a exclusão de outros movimentos reformadores
além do luteranismo, que eram perseguidos por católicos e luteranos. Na época,
não havia nenhum príncipe calvinista, mas o movimento cresceria e alguns
príncipes, inclusive eleitores, se converteriam ao calvinismo. Os calvinistas,
outro grupo protestante dentro do cristianismo, reivindicavam os mesmos
privilégios concedidos aos luteranos na Paz de Augsburg, mas os imperadores do
Sacro Império não estavam dispostos a isso. Outro ponto é que a proibição de
confisco de propriedades eclesiásticas não foi respeitada. Essas diferenças
poderiam ser resolvidas por diplomacia, mas, no lugar disso, recorreu-se à guerra.
Em 1609, a
disputa pela sucessão dos ducados de Jülich-Cleves-Berg entre Wolfgang William
apoiado por católicos e John Sigismund apoiado por protestantes poderia ter
iniciado o conflito, que só tinha sido postergado pela Paz de Augusburg, mas
isso só aconteceria depois.
Em 1618,
ocorreria a Defenestração de Praga, que iniciaria a Guerra dos Trinta Anos.
Membros dos estados da Boêmia se reuniram para discutir a interferência do
imperador Ferdinando em questões de liberdade religiosa e política. Os líderes
protestantes receberiam uma ameaça de prisão pelo imperador, mas continuariam a
desafia-lo. Em 23 de maio de 1618, os líderes se reuniram no Castelo de
Hradcany onde ficava a chancelaria boêmia para apresentar aos regentes as
respostas aos questionamentos do imperador. O encontro foi de mal a pior e uma
massa de pessoas invadiu a chancelaria. Eles cercaram dois dos principais
regentes católicos, Wilhelm Slawata e Jaroslav Borsita von Martinitz, que eles
culpavam pela repressão religiosa. Em seguida, os jogaram pela janela,
iniciando a revolta da Boêmia.
Religião foi
um tema importante nessa guerra, mas não se restringia a isso e interesses
políticos muitas vezes levaram a alianças inter-religiosas no Sacro Império
Romano. Dependendo das conveniências do momento, os príncipes confrontavam ou
se aliavam ao imperador, como ocorreu na supressão da rebelião boêmia, que uniu
o imperador, o luterano duque da Saxônia, o católico duque da Bavária e os
católicos habsburgos contra os calvinistas. O duque da Saxônia depois se
aliaria a outros protestantes e os suecos contra o imperador, e depois se
aliaria ao imperador para enfrentar os suecos.
A Guerra
também foi uma oportunidade de tentar obter ganhos territoriais, tanto países
estrangeiros cobiçando territórios do Sacro Império Romano, quanto partes do
Império tentando obter mais territórios (como a Espanha) e príncipes querendo
ampliar os seus domínios. Fatores pessoais dos mais diversos e circunstâncias
locais, como quebras de safras e maus relacionamentos entre os príncipes,
também influenciaram o xadrez político da guerra, que foi extremamente fluído,
com diversas trocas de lados, entrada de novos participantes e retirada de
outros.
A guerra se
encerraria com a Paz de Vestefália em 1648, com um acordo que encerraria a
maioria dos conflitos iniciais e outros que surgiram ao longo da guerra. Esse
foi um acordo difícil, já que as campanhas militares e as alianças acabavam por
embolar a situação inicial e tornaram mais difícil o estabelecimento de acordos
mutuamente satisfatórios. Mas, de um jeito ou de outro, o acordo saiu e
encerrou as hostilidades.
Efeitos sociais da Guerra
Todas essas
questões políticas escondem quem realmente sofreu com a guerra, que foram as
pessoas comuns. Eram obrigadas a participar dos esforços de guerra, havendo uma
“contribuição” para ajudar no financiamento do exército. Impostos com maior
consentimento dos pagadores de impostos e ajuda externa também ajudaram a pagar
a guerra.
Por
consequência direta da guerra ou indireta através de fome e peste, a estimativa
é que um quarto da população civil do Império tenha morrido. De uma forma ou de
outra, todos sofreram, seja com guerra, praga, impostos ou invasões, em alguns casos mais de uma vez. Os civis em geral não eram alvos,
mas acabaram sendo explorados pelos exércitos em guerra. Nas cidades, as
pessoas eram obrigadas a abrigar soldados e oferecer suprimentos como forma de
contribuição para a guerra. No campo, a taxação era mais forte e alimentos eram
tomados a força. Não era intenção dos articuladores da guerra causar sofrimento
aos civis, mas havia preocupações maiores para eles e essa foi uma consequência
inevitável.
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