quarta-feira, 14 de maio de 2014

Batalha da Floresta de Teutoburgo


Sobre Itália, vou começar a falar sobre Império Romano. Pretendo no futuro fazer uma série sobre Roma e essa pode ser entendida como uma primeira parte. O jogo que eu vou usar é o Total War: Rome 2, não na parte de campanha, e sim em um de seus cenários, a Batalha da Floresta de Teutoburgo. Como o que eu tenho a falar é mais longo do que esse cenário, complemento com o mesmo cenário do Rome: Total War 1 . A fonte de informação é o livro Teutoburg Forest AD 9, de Michael McNally, publicado pela Osprey.

A Batalha da Floresta de Teutoburgo opôs o germânico Armínio e o general romano Varo no ano 9 depois de Cristo. Diferente de outras batalhas, é incerta a localização exata de onde a batalha foi travada. É provável que o palco da última batalha de Varo tenha sido em algum lugar ao redor da cidade de Detmold na parte sul da Floresta de Teutoburgo. Há ainda hoje uma discussão sobre onde teria sido essa batalha, mas não cabe aqui entrar nesses detalhes.

O contexto da batalha era o conflito permanente entre Roma e as tribos germânicas na Germânia Magna ao leste do Rio Reno. As principais tribos germânicas em guerra com Roma eram os Queruscos, os Suebii e os Sugambri. Roma já estava em guerra com tribos germânicas desde pelo menos dois séculos antes de Cristo. No comando das campanhas contra os germânicos, passaram Caio Mário, famoso pelas vitórias em Aquae Sextiae e Vercellae e depois Júlio César, governador da Gália defendendo a região de ataques germânicos durante seu mandato. Depois de algum tempo, Druso, enteado do Imperador Augusto, seria nomeado como governador da Gália e seria responsável pelas principais vitórias de Roma em território germânico, embora isso não tenha resultado em anexação.

Após algum tempo, na entrada da era cristã, seguiu-se um período de paz e prosperidade, florescendo um rico comércio com as regiões germânicas, que agora optaram por se aliar aos romanos, inclusive com muitos guerreiros germânicos se alistando em Roma. Essa paz e prosperidade tornariam Roma complacente, e isso seria fatal nos eventos do ano 9 da era cristã.

Lados Opostos
Vou falar agora sobre os comandantes dos dois lados opostos da batalha. Públio Quintílio Varo (46 a.c.-9 d.c.) é o único filho de Sextus Quintílio Varo, um oficial da facção de Pompéia que cometeu suicídio após a batalha de Filipos ao invés de ser preso por traição. Varo subiu rapidamente na carreira pública e em 22 antes de cristo foi eleito Questor, o primeiro cargo na hierarquia da cursus honorum, o curso dos oficiais na Roma Antiga, mais ou menos 6 anos antes dos 30 anos, quando estaria elegível ao cargo. No ano 20 antes de Cristo ele casaria com Vipsania Marcella Agripa, filha de Marco Vipsânio Agripa. No ano 15 antes de Cristo comandaria com sucesso a legião XIX em Noricum e Raetia. Isso elevaria ainda mais a sua posição social e em 13 antes de Cristo ele seria eleito cônsul júnior.

Em 8 antes de Cristo, Varo seria nomeado governador da província senatorial da África e no próximo ano foi eleito governador da Síria, o mais importante cargo na parte leste do Império, que ele conseguiu levar em bom nível. Findo seu mandato na Síria, voltaria para Roma, casaria com a sobrinha do Imperador, aumentando ainda mais o seu status que o levaria para o comando da Germânia no ano 7 depois de Cristo.

Armínio, o adversário de Varo na Batalha de Teutoburgo, era o filho mais velho de um influente nobre da tribo dos Queruscos, que ficava perto da atual cidade de Minden. Nas campanhas de Druso, reféns foram feitos das tribos germânicas e Armínio estava dentre os reféns para assegurar o bom comportamento das tribos. Com mais ou menos 10 anos, Armínio receberia a mesma educação dedicada aos romanos nobres. Duas memórias ficariam fixadas no jovem Armínio: a emboscada de Queruscos, provavelmente liderada por seu pai, contra Druso e a campanha bem sucedida de Druso que o levou a virar refém de Roma. Armínio entenderia que os romanos podem ser derrotados, desde que a sua flexibilidade tática e disciplina fossem desafiadas. O tempo que passou em Roma serviria para aprender mais sobre o inimigo.

Perto dos 20 anos, retornaria para seu povo para suceder seu pai, ele supostamente sendo um bom embaixador entre Roma e os Queruscos. Seu irmão mais novo o substituiria como refém, talvez jovem demais para sofrer retaliação no caso de um ataque dos Queruscos.

Exércitos Opostos
Agora vou falar sobre os exércitos de Roma e dos germânicos. Quando foi nomeado general na Germânia, Varo tinha cinco legiões sob comando mais unidades auxiliares que devem totalizar uns 20% da linha de frente. Na época imperial, cada legião era dividida em 10 sub-unidades ou cohortes, cada uma dividida em seis centúrias de 80 soldados e 20 servos cada, comandadas por um centurião. Cada legião completa tinha 4.800 homens apoiada por 120 unidades de cavalaria com a tarefa de batedor e de escolta. A estimativa é que Varo tinha 17 mil combatentes mais 3.800 não combatentes na Batalha de Teutoburgo.

A principal arma de um legionário era o dardo pesado (pilum), desenhada para dobrar no impacto para entrar no escudo inimigo e torna-lo pesado demais para ser usado. Além do mais, a arma torna-se inútil depois da batalha, o que impossibilitaria o inimigo de usá-lo ao mesmo tempo que pode ser refeita pelos ferreiros romanos. A arma secundária eram o gládio, espada curta de perfuração, e a adaga púgio. Para defesa, os legionários usavam um escudo retangular na mão esquerda (o scutum), um elmo de ferro ou bronze e uma cota de malha.

A tática de combate envolvia arremessar o pilum nos escudos inimigos, atrapalhando a coesão do inimigo até que eles chegassem próximo para o combate corpo a corpo, usando o gládio para apunhalar e o escudo como arma. Além dos soldados romanos, as legiões podiam contar com o apoio dos numeri, tropas de aliados de Roma em número variável, usando os equipamentos de sua própria nação. Com a redução no número de legiões e de soldados, era necessário aumentar o número do efetivo e essa foi uma solução de baixo custo. Outro tipo de tropa era o auxiliarius, composto por pessoas sem status social que poderiam receber o título de cidadão após o fim do seu tempo de alistamento. Eles eram equipados de forma parecida que os legionários, mas com uma lança mais leve, a lancea, e um escudo redondo ao invés do retangular. Havia ainda especialistas em arcos (sargittarii).

Diferente dos romanos e de outros de seus adversários, os germânicos não mantinham registros escritos que pudessem dar maiores detalhes sobre o exército de Armínio, por isso, é necessário recorrer a estimativas que variam muito. As estimativas mais razoáveis variam entre 20 e 30 mil homens, o que superaria a tropa de Varo. Além de Queruscos, também havia tropas Angrivarii e Bructeri. É necessário também enfatizar que nem todos estariam tão bem equipados, já que qualquer germânico poderia ser um guerreiro.

Os guerreiros mais bem equipados utilizavam a framea, uma lança que podia ser usada tanto para arremesso quanto para combate corpo a corpo. Como uma arma secundária, espada ou machado, com adaga como arma de último recurso. Na defesa, escudo redondo ou hexagonal. Cota de malha era rara entre os guerreiros e provavelmente era mais fruto de espólio de guerra do que produção própria.

Varo na Germânia
Como mencionado anteriormente, a Germânia estava relativamente pacificada na época. Ainda é uma incógnita a razão da expedição de Varo na Germânia, sendo cogitado uma campanha de conquista ou de coleta de impostos. O mais provável é que Varo foi mandado mais por razões políticas do que bélicas, ele mesmo sendo melhor político do que guerreiro. Varo foi mais para manter o status quo do que para conquistar a Germânia, para reassegurar as tribos aliadas de que Roma estava com elas e evitar revoltas.

Para esse fim, foram enviadas procissões regulares para territórios disputados para mostrar a força de Roma. Para ajudar nessa missão, Varo contava com o auxílio de tribos mais aliadas e com os líderes dessa tribo. E havia um líder que parecia ser confiável, que recebeu educação romana e que já havia servido Roma. Seu nome: Armínio.

Não se sabe quando Armínio resolveu se voltar contra Roma, mas sua convivência com os romanos e o conhecimento de táticas bater e correr das tribos germânicas o tornaram o candidato perfeito para liderar uma vitória sobre Roma em território germânico. Armínio buscou apoio de outras tribos, já que os Queruscos sozinhos não conseguiriam enfrentar o exército de Varo. E todo o planejamento do ataque se baseava na rapidez do ataque, já que um confronto mais prolongado beneficiaria os romanos, que eram qualitativamente superiores aos germânicos. Armínio tinha em mente três objetivos: manter em Varo a percepção de que estava em território amigável; fazê-lo montar o acampamento de verão em território Querusco e atrasar a volta para o acampamento de inverno.

A campanha

A campanha de Varo na Germânia começou no ano 9 AD. O exército atravessou o Reno e estabeleceu o acampamento de verão em território Querusco, onde ele receberia delegações germânicas amigas ou hostis para negociações. Ao longo do caminho, foi criando guarnições para facilitar a logística em território germânico, para essa e outras expedições futuras. Uma vez no acampamento de verão, não se sabe exatamente o que Varo fez em território germânico. Armínio deve ter aproveitado essa ocasião para dialogar com tribos inimigas de Roma e tentar conseguir mais apoio em uma futura insurreição.

Armínio armaria alguns ataques contra romanos em patrulha ou trabalho ao redor do acampamento. A intenção era incitar uma campanha militar por parte dos romanos e desviar a rota de Varo de volta para o Reno para um caminho que favoreceria Armínio. O seu plano deu certo e Varo mudaria os planos para enfrentar tribos germânicas e também mudou a sua rota de volta.

Em 7 de setembro, Varo anunciaria os seus planos para as tropas e partiria em uma rota de volta para o Reno e ao mesmo enfrentaria os germânicos seguindo para noroeste. Armínio iria na frente, prometendo reencontrar o resto do exército daqui a dois ou três dias. Secretamente, ele foi se encontrar com seus aliados. Essa seria a última vez que Armínio e Varo se veriam.

No dia 8, retomariam a macha. O exército de Varo entraria em uma região de floresta pesada, o que diminuiria o ritmo da marcha e os tornaria mais vulneráveis a ataques. Homens da tribo Bructeri lançaram ataques bater-e-correr contra os romanos, parte do plano de Armínio de cansar os romanos, causar danos e os deixar desconfortáveis. A floresta densa impossibilitava que eles entrassem em formação da maneira apropriada contra os agressores e os feridos resultantes desses ataques diminuiriam ainda mais o ritmo da marcha. No primeiro dia de confrontos, as baixas não foram muito consideráveis. Nesse dia, cairia uma chuva torrencial que atrapalharia ainda mais os romanos, embora também prejudicasse os germânicos. À noite, Varo teria uma reunião de guerras, as suas principais preocupações sendo o movimento da cavalaria e dos trens de bagagem através da floresta.

Como decorrência das chuvas do dia anterior, a estrada virou um lamaçal intransponível, e os romanos não puderam marchar no dia seguinte. Varo mandaria batedores, um grupo para para verificar o caminho adiante e verificar a posição e força do inimigo e outro para se se encontrar com o grupo de Armínio. Apenas um dos grupos retornaria. O primeiro grupo relataria que o caminho adiante está impossível de percorrer por conta da lama, que atrasaria principalmente os carros de bagagem. O segundo grupo foi capturado e torturado até relevar a situação das forças de Varo, sendo mortos posteriormente.

Tudo estava saindo de acordo com o plano de Armínio. Ele enviaria mensagens para os Angrivarii e os Bructeri para reforçar os ataques bater-e-correr e preparar uma emboscada no caminho que Varo obviamente seguiria, sem ter guias locais (os que eles tinham, homens de Armínio, já os deixaram). Com o não retorno dos batedores, Varo deve ter percebido que alertas anteriores sobre a lealdade de Armínio eram verdadeiros.

A marcha retomaria no dia seguinte independente das condições da estrada. Varo faria algumas modificações, como abandonar o máximo de bagagem possível, que a essa altura era um estorvo, o que acabou por diminuir o tamanho da coluna de marcha. Não-combatentes receberam armas improvisadas e os feridos com gravidade seriam deixados para trás.

Antes do amanhecer, os romanos desmontaram acampamento sem alarde, para não chamar a atenção do inimigo. Varo esperava conseguir forçar seu caminho para o oeste e sair da floresta, esperando ter maior vantagem em campo aberto. A formação tinha três partes, a vanguarda que estaria mais próxima do inimigo com duas legiões, o quartel-general com Varo e a retaguarda com o que restou da bagagem e a terceira legião. A cavalaria, comandada por Numonius Vala, ia atrás da retaguarda. Como a cavalaria não ia conseguir lutar na floresta, Varo preferiu que ficasse atrás retaguarda para proteger contra perseguição inimiga.

Com dificuldade, o exército de Varo avançou e deixou por completo o acampamento. Os germânicos retomaram as operações de bater-e-correr , causando baixas no exército romano que não podia contra-atacar e perseguir os germânicos na floresta. Feridos foram não apenas sendo deixados para trás, mas mortos pelos próprios companheiros para evitar serem capturados, o que abriu clareiras e desorganização na formação romana. A linha de comunicação tinha se quebrado, já que era impossível alguém se mover para trás ou para frente da coluna sem atrapalhar o movimento geral, e a prioridade era se mover o mais rápido possível.

À noite, as tropas de Varo conseguiram deixar a floresta e a prioridade passou a ser encontrar uma área defensável para montar um acampamento. Não se sabe ao certo a sua localização, mas provavelmente foi em um local elevado para dar alguma vantagem para a defesa. No acampamento, Varo pode ver melhor a má situação de seu exército, com baixas consideráveis infligidas pelos germânicos.

No acampamento, Varo mandaria Vala e a cavalaria para o norte para buscar reforços entre as tropas romanas ou os aliados germânicos de Roma. Porém, Vala foi atacado por tropas de Armínio, que exterminaram o inimigo, fechando a opção de ir para o norte. Restava seguir para o oeste e voltar para a floresta, e voltar a ficar vulnerável a emboscadas, ou ir para o sul, tendo que ir por um caminho acidentado. Ficar acampado, apesar da disponibilidade de suprimentos, não seria uma boa ideia pois chamaria o inimigo até eles.

Após a destruição das tropas de Vala, Varo tomaria a decisão de tirar a própria vida, assim como fez seu pai antes dele, por uma combinação de desejo de preservar a honra da família, sentimento de falha e para evitar ser capturado com vida pelos germânicos. Esse gesto não deve ser encarado como sinal de covardia, mas de muita coragem e uma aceitação completa da culpa do fracasso e uma maneira de proteger a herança de seu filho, assim como seu pai fez com ele. Outros soldados seguiriam o seu exemplo e caberia a Lucius Eggius e Caeonius liderarem as tropas dai em diante.

Antes do amanhecer do 11 de setembro do ano 9, as tropas de Eggius partiram para a última marcha em direção ao oeste, por dentro da floresta. Além de sofrer mais ataques bater-e-correr, os romanos se depararam com uma bifurcação. Por um caminho, que descia, provavelmente havia uma inundação. Então, seguiram pelo outro caminho, só para encontrarem um baluarte germânico pelo qual teriam que passar para prosseguir.

Não havia outra opção a não ser atacar o baluarte. Esse ataque é ilustrado no livro que eu uso como referência nas páginas 74 e 75. Um grupo avançava contra a fortificação e deixava os escudos para serem usados como rampas, que outro grupo utilizaria para se aproximar da fortificação e tentar destruí-la, enquanto os germânicos eram bombardeados por lanças. O restante ficava como reserva, atentos para possíveis contra-ataques.

As tropas de Caeonius, que partiram depois de Eggius, saíram do acampamento sob vigilância das tropas de Armínio. Quando Caeonius já estava longe o suficiente do acampamento, Armínio ordenaria o ataque contra os romanos em marcha. Em muito menor número, alguns tentaram voltar para o acampamento e outros seguirem rapidamente para oeste para tentar encontrar as tropas de Eggius. Caeonius, que tinha conseguido voltar para o acampamento, recebeu uma oferta de Armínio para negociar. Armínio perguntou onde estava Varo e Caeonius apontou o túmulo de Varo. Em seguida, Armínio ordenou que o morticínio prosseguisse, depois a cabeça de Varo sendo recuperada e levada como troféu.

Ao oeste, as tropas de Eggius não tiveram como passar pelo baluarte e recuaram, para encontrar o que restou das forças de Caeonius. Sem nenhuma outra alternativa, eles se agruparam e voltaram a atacar o baluarte. Sem consideráveis reforços de seu lado, e com o aumento no número de inimigos vindo das tropas de Armínio, o inevitável resultado só poderia ser a derrota.


Não se sabe se esse ataque de Armínio foi feito com a intenção de entrar em guerra com Roma ou apenas desafiar Roma, mas o fato é que Armínio não receberia o apoio de mais tribos para um ataque contra Roma, mais notadamente, Marobóduo dos Marcomanos. No fim, Armínio enviaria a cabeça de Varo para Roma, acendendo ainda mais o desejo por vingança. Agora com as tropas da Germânia sob comando de Germânico, Roma continuou em guerra com as tribos germânicas por algum tempo, tanto por desejo de vingança quanto para recuperar as aquiale perdidas, mas chegou uma hora que Tibério simplesmente decidiu encerrar os confrontos e que o Reno marcaria a fronteira norte do Império Romano.

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