quarta-feira, 2 de julho de 2014

Guerra dos Trinta Anos (#1) - Geral



Sobre a Alemanha, eu vou falar da Guerra dos Trinta Anos, que acabou envolvendo a Guerra dos Oitenta Anos e as duas terminariam juntas. Nesse vídeo, vou falar um panorama bem geral sobre o conflito e poderei entrar em maiores detalhes em outros vídeos. A fonte de informação é o livro The Thirty Years War: A Documentary History de Tryntje Helfferich e a gameplay do Europa Universalis IV.

A Guerra dos Trinta Anos, ocorrida entre 1618 e 1648, foi um dos mais complexos conflitos ocorridos na Europa antes do século XX. Envolve elementos religiosos com o conflito de católicos do Sacro Império Romano e os protestantes e também elementos políticos, com os habsburgos do Sacro Império Romano buscando a hegemonia na Europa e recebendo oposição de países como a Suécia e a França, que era católica, inclusive.

A Guerra começou com a defenestração de Praga em 1618 e continuou de maneira descontínua pelos próximos trinta anos, eles não ficaram se matando continuamente por trinta anos seguidos. Basicamente, são duas fases, antes e depois de 1631. Esse ano é importante por marcar a vitória da Suécia liderada por Gustavo Adolfo na batalha de Breitenfeld, o que abriu caminho para uma invasão maior da Alemanha, a Bavária e Munique sendo ocupadas no ano seguinte. Além disso, Suécia e França fizeram um acordo nesse ano e a partir de então o conflito já era definitivamente um conflito europeu, e não apenas alemão.

O principal teatro da Guerra dos Trinta Anos era a Alemanha. O Sacro Império Romano era um estado multiétnico, multilinguístico e multireligioso que abrange os territórios atuais da Alemanha, Holanda, Bélgica, Luxemburgo, França oriental, Suíça, norte da Itália, Áustria, Eslovênia, Hungria, República Tcheca e Polônia ocidental. Era uma frouxa república federal e uma monarquia eletiva que foi dominada por uma família, os habsburgos, de forma que eles quase consideravam a monarquia como hereditária.

A estrutura política do Império era hierárquica e regional e, apesar de funcionar bem por muito tempo, acabou contribuindo para as tensões que levariam até a guerra. Segundo a Bula de Ouro de 1356, o Imperador era eleito por sete príncipes do Império. Três desses príncipes eram eclesiásticos, sendo eles os arcebispos de Mainz, Colônia e Trier. Quatro eram príncipes seculares, o rei da Boêmia, o duque da Saxônia, o marquês de Brandeburgo e o conde Palatino do Reno. Havia ainda outros príncipes menores, que governavam territórios de tamanhos variados e respondiam ao imperador. Eles tinham um assento na legislatura imperial, a dieta, e pertenciam a um dos dez círculos, ou regiões, que tinham suas próprias defesas e cuidavam da defesa e taxação na região. A dieta imperial tinha três colegiados, um dos príncipes votantes, outro dos demais príncipes e outro das cidades imperiais livres.

Dentro de cada território, havia uma série de pessoas subordinadas ao príncipe da região e não diretamente ao imperador. Esses territórios também tinham suas próprias dietas, dividas em três para clérigo, nobres e burguesia. A maioria dos principados era hereditária, com a notável exceção do reino da Boêmia.

Uma das insatisfações políticas da época era o desejo dos governos locais de ter maior liberdade em relação aos príncipes e estes em relação ao imperador. Os direitos tradicionais dos príncipes eram chamados de liberdades germânicas e se tornou grito de ordem de todos aqueles que se opunham ao imperador. Príncipes estrangeiros também usariam o mote de que a liberdade germânica sofria em todos os locais e precisava ser preservada. O imperador, por sua vez, via insubordinação por parte dos príncipes.

A Guerra dos Trinta Anos foi multifacetada e é composta por uma série de conflitos menores e mais localizados, como a rivalidade entre Bourbons franceses e os habusburgos, entre Suécia e Polônia e revoltas em diversas localidades do Sacro Império incluindo os Países Baixos. No final, juntar todos esses conflitos é uma maneira didática de compreender essa série de guerras e disputas.

A origem da Guerra dos Trinta Anos remonta a Paz de Augsburg, assinada em 1555. Antes desse período, vários príncipes germânicos se converteram ao luteranismo e passaram a reformar as práticas religiosas em suas regiões, causando uma série de conflitos dentro e fora desses territórios. Desgastado por essas disputas, o Imperador Carlos V aceitaria ceder aos príncipes luteranos. O acordo estabeleceu que os príncipes germânicos poderiam escolher entre o luteranismo ou o catolicismo, teriam tratamento justo nas cortes e poderiam reformar seus domínios como quisesse. As propriedades eclesiásticas confiscadas permaneceriam com os protestantes, mas nenhum confisco adicional poderia ser feito. As pessoas não tinham liberdade religiosa, mas podiam emigrar. Isso paralisou os conflitos religiosos no Sacro Império Romano e preveniu uma guerra civil mais aguda.

Essa solução não era isenta de problemas, como a exclusão de outros movimentos reformadores além do luteranismo, que eram perseguidos por católicos e luteranos. Na época, não havia nenhum príncipe calvinista, mas o movimento cresceria e alguns príncipes, inclusive eleitores, se converteriam ao calvinismo. Os calvinistas, outro grupo protestante dentro do cristianismo, reivindicavam os mesmos privilégios concedidos aos luteranos na Paz de Augsburg, mas os imperadores do Sacro Império não estavam dispostos a isso. Outro ponto é que a proibição de confisco de propriedades eclesiásticas não foi respeitada. Essas diferenças poderiam ser resolvidas por diplomacia, mas, no lugar disso, recorreu-se à guerra.

Em 1609, a disputa pela sucessão dos ducados de Jülich-Cleves-Berg entre Wolfgang William apoiado por católicos e John Sigismund apoiado por protestantes poderia ter iniciado o conflito, que só tinha sido postergado pela Paz de Augusburg, mas isso só aconteceria depois.

Em 1618, ocorreria a Defenestração de Praga, que iniciaria a Guerra dos Trinta Anos. Membros dos estados da Boêmia se reuniram para discutir a interferência do imperador Ferdinando em questões de liberdade religiosa e política. Os líderes protestantes receberiam uma ameaça de prisão pelo imperador, mas continuariam a desafia-lo. Em 23 de maio de 1618, os líderes se reuniram no Castelo de Hradcany onde ficava a chancelaria boêmia para apresentar aos regentes as respostas aos questionamentos do imperador. O encontro foi de mal a pior e uma massa de pessoas invadiu a chancelaria. Eles cercaram dois dos principais regentes católicos, Wilhelm Slawata e Jaroslav Borsita von Martinitz, que eles culpavam pela repressão religiosa. Em seguida, os jogaram pela janela, iniciando a revolta da Boêmia.

Religião foi um tema importante nessa guerra, mas não se restringia a isso e interesses políticos muitas vezes levaram a alianças inter-religiosas no Sacro Império Romano. Dependendo das conveniências do momento, os príncipes confrontavam ou se aliavam ao imperador, como ocorreu na supressão da rebelião boêmia, que uniu o imperador, o luterano duque da Saxônia, o católico duque da Bavária e os católicos habsburgos contra os calvinistas. O duque da Saxônia depois se aliaria a outros protestantes e os suecos contra o imperador, e depois se aliaria ao imperador para enfrentar os suecos.

A Guerra também foi uma oportunidade de tentar obter ganhos territoriais, tanto países estrangeiros cobiçando territórios do Sacro Império Romano, quanto partes do Império tentando obter mais territórios (como a Espanha) e príncipes querendo ampliar os seus domínios. Fatores pessoais dos mais diversos e circunstâncias locais, como quebras de safras e maus relacionamentos entre os príncipes, também influenciaram o xadrez político da guerra, que foi extremamente fluído, com diversas trocas de lados, entrada de novos participantes e retirada de outros.

A guerra se encerraria com a Paz de Vestefália em 1648, com um acordo que encerraria a maioria dos conflitos iniciais e outros que surgiram ao longo da guerra. Esse foi um acordo difícil, já que as campanhas militares e as alianças acabavam por embolar a situação inicial e tornaram mais difícil o estabelecimento de acordos mutuamente satisfatórios. Mas, de um jeito ou de outro, o acordo saiu e encerrou as hostilidades.

Efeitos sociais da Guerra
Todas essas questões políticas escondem quem realmente sofreu com a guerra, que foram as pessoas comuns. Eram obrigadas a participar dos esforços de guerra, havendo uma “contribuição” para ajudar no financiamento do exército. Impostos com maior consentimento dos pagadores de impostos e ajuda externa também ajudaram a pagar a guerra.

Por consequência direta da guerra ou indireta através de fome e peste, a estimativa é que um quarto da população civil do Império tenha morrido. De uma forma ou de outra, todos sofreram, seja com guerra, praga, impostos ou invasões, em alguns casos mais de uma vez. Os civis em geral não eram alvos, mas acabaram sendo explorados pelos exércitos em guerra. Nas cidades, as pessoas eram obrigadas a abrigar soldados e oferecer suprimentos como forma de contribuição para a guerra. No campo, a taxação era mais forte e alimentos eram tomados a força. Não era intenção dos articuladores da guerra causar sofrimento aos civis, mas havia preocupações maiores para eles e essa foi uma consequência inevitável.

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